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Afrofuturismo: fantasia, tecnologia e ancestralidade

Desde a antiguidade, os povos negros africanose suas inúmeras diásporas sempre demonstraramatravés de levantes estarem prontas para imaginar eviver futuros onde suas pátrias, descendências,culturas e vidas seriam livres de qualquer tipo deopressão. E é esta certeza, a de merecer um futuroque vai levar a população africana e afrodiaspórica,aonde quer que esteja a pensar o Futurismo Negro,tanto de modo histórico exigindo direitos e dignidadeatravés de pessoas reais como, por exemplo, MartinLuther King, Mandela ou Aqualtune, quanto deforma ficcional contemplando realidades alternativasonde liberdade e existência são necessidadesbásicas conquistadas frente a uma linha do tempohistórica cheia de entraves à estes princípiosbásicos, e insegura à sua presença no presente eprincipalmente no futuro.

Esse ímpeto deve ter sido o combustível que fezMartin Delany, um dos principais líderes políticosnegros dos EUA (1859) escrever e publicar naAnglo-African Magazine, Blake, or the Huts ofAmerica (Blake, ou Cabanas da América) cujo temaé uma revolta de escravos bem-sucedida nosestados do sul e a fundação de um país negro emCuba. Mas teria ele sido inspirado por Nat Turnerque décadas antes (1831) conclamou uma rebeliãoque aterrorizou os escravistas na Virginia? Ouestaria ele desejando ardentemente, através de umavisão alternativa, a liberdade plena finalmentealcançada em 1863 com a vitória do norte na guerracivil? Eis um exemplo onde ficção e realidadeconectam passado, presente e futuro, o pulsantepropósito do Afrofuturismo.

O termo Afrofuturismo nasceu no campo daficção científica, sendo utilizado a primeira vez peloescritor branco Mark Dery em Black to the Future,num ensaio e depois num capítulo do livro FlameWars: The Discourse of Cyberculture (1994),onde busca compreender através de entrevistascom Samuel R. Delany, Greg Tate e Tricia Rose, apequena presença de escritores afroamericanos naficção científica oficial americana, a mainstream(palavra sem tradução) que apresenta no termo,neste caso, um ideário de poderio, sobreposiçãodominante, uma teia discursiva que mantém ohomem branco, heteronormativo, falsamente comoum ser legitimante de seu próprio discurso e até danoção de humanidade, refutando qualquer outrapresença ou representatividade que não oreconheça como universal, ou seja, mainstream.

Posso dizer que foi uma experiência estranha, aceitarum prêmio [Nébula, 1968] em uma sala cheia depessoas com smoking e vestidos de noite e então,deste mesmo lugar onde o aceitei, ouvir umarepreensão de meia hora de uma eminência, quedeclara que este prémio é imerecido e para aspessoas que o elegeram um grupo de estúpidosincautos. Não é paranoia, contei mais de uma dúziade pares de olhos passeando entre o falante e euque continuou com a trivialidade de obrasgratificantes como a minha e a tolice dos mais decem escritores que votaram nela. (DELANY, 2011,tradução livre)

A partir desta realidade experimentada tanto porSamuel R. Delany em 1968 quanto por N. K. Jemisinem igual teor ou pior em 2016/2017 é possível sentirque a política de invisibilidade é muito atual e quetrocar a realidade dos dois entre os tempos em nadaafetaria o que sofreram.

Desdobramentos no tempo

Logo, podemos dizer que a nomenclaturaafrofuturismo se popularizou ao retroceder notempo, reforçando e abraçando o Futurismo Negrodesde seus primórdios amplos à sua efervescênciaatual, não apenas no campo da literatura, mas damúsica, filmografia, artes, enfim… todo o espaçoocupado por uma mente negra reescrevendo ofuturo com a sua presença.

Ao adentrar neste movimento que se tornamundial e investigar sua base filosófica, sustentadapor referenciais muito anteriores ao termo, é possívelcaptar em suas reorganizações, tanto de ideiasquanto de conceitos e estética, as basesepistemológicas do Afrocentrismo, pensamento queganhou corpo teórico em 1980 através dopesquisador afroamericano Molefi Kete Asante, queo define da seguinte forma:

Afrocentricidade é um modo de pensamento e açãono qual a centralidade dos interesses, valores eperspectivas africanas [negras] predominam. Emtermos teóricos é a colocação do povo africano[África e diásporas] no centro de qualquer análise defenômenos africanos. Assim é possível que qualquerum seja mestre na disciplina de encontrar o lugar dosafricanos num dado fenômeno. Em termos de ação ecomportamento, é a aceitação/observância da ideiade que tudo o que de melhor serve a consciênciaafricana se encontra no cerne do comportamentoético. Finalmente, a Afrocentricidade procuraconsagrar a ideia de que a negritude em si é umtropo de éticas. Assim, ser negro é estar contra todasas formas de opressão, racismo, classismo,homofobia, patriarcalismo, abuso infantil, pedofilia edominação racial branca. (ASANTE, 2014, p. 3)

O pensamento afrocêntrico desafia a pessoanegra a nascer de novo, reconhecendo que suaexistência no mundo é um acúmulo de signoseurocentristas que não a referenciam ou respeitam,pelo contrário, a inferiorizam-na e deslegitimamenquanto sujeita capaz de ter voz, consciência eprodução.

Jemisin gostava de ficção científica e fantasiaquando era criança. Mas ela não escrevia sobrepersonagens negros ou femininos antes de tropeçarcom Octavia Butler ainda adolescente. Ao ler, eu[Jemisin] disse:”Caramba, acho que essa mulher énegra. Procurei uma foto, e não havia nenhuma. Emvez disso, a capa do livro estava rebocada com aimagem de uma mulher branca. Deixei a foto de lado”– foi um momento de iluminação para Jemisin. “Eununca tinha visto isso em sci-fi [science fiction] antes”,afirmou. Ela nunca havia pensado que uma liderançapoderia ser outra coisa senão um homem branco.(WOMACK, 2013, p. 96, tradução livre)

Já dentro do gênero ficção científica temos bonsexemplos do que significa refazer caminhos e visões:

A mudança da terminação “punk” para “funk” é outro elemento importante, pois sai da dinâmica de um rock “branco” para um soul negro. A lógica funk tema ver com a experiência de uma pessoa negra: a experimentação sensorial; pessoa chave da mudança, relendo a escravidão, relendo os problemas urbanos passados – presentes – futuros.É como se o som funk, o letrismo do hip-hop, os atabaques africanos, os tambores afrocubanos batá, as cuícas brasileiras e os remixes da mesa de som encontrassem uma harmonia eco existissem ajudando a contar histórias.Novas concepções de subgêneros: Dieselfunk;Cyberfunk; Rococoa; Steamfunk; Sword & Soul;Blaxploitation; Blackstatic; Alternate History.

Nesse sentido é certo afirmar que a concepção de raça [ler Kabengele Munanga e Carlos Moore]como uma tecnologia, dentro do Afrofuturismo esob preceitos distinguíveis do sistema racista, podee deve ser considerada num âmbito maior destemovimento político-ideológico e estético como umartefato maior de poder, que bem sustentado earticulado tem a capacidade de plantarquestionamentos na psique da população negra quevive sob projetos de vida e nação racialmentedesfavoráveis.

Desta forma, podemos concluir que o Afrofuturismo é uma metáfora afrocentrada realista sobre o verdadeiro reflexo de uma pessoa negra, que precisa experimentar o seu eu enegrecido em essência, seja como escritor ou escritora, leitor ou leitora, compreendendo que é possível e mais do que justo, que protagonize o seu destino ou que crie mundos onde heróis de heroínas de face negra sejam sujeitos da narrativa.

Referências Bibliográficas

MOORE, Carlos (2007): Racismo & sociedade:novas bases epistemológicas para entender oracismo. Belo Horizonte: Mazza Edições.

CARNEIRO, Aparecida Sueli (2005): A construçãodo outro como não ser como fundamento do ser.Tese (doutorado). São Paulo: Universidade de SãoPaulo.

WOMACK, Ytasha (2013): Afrofuturism. The Worldof Black Sci-Fi and Fantasy Culture.EUA: LawrenceHill Books.

DELANY, Samuel (2011): “RUNES SANGUINIS /Racismo y Ciencia Ficción”. Em: NYRSF – The NewYork Review of Science Fiction (1998) e integrantede Dark Matter: A Century of Speculative Fictionfrom the African Diaspora (2000).ASANTE, Molefi Kete. Afrocentricidade: A Teoria DaMudança Social (1980).

 TIMBUKTU – MALI – ÁFRICA

SANKOFIA

Sankofia é uma ideia que resolvi criar para batizar meus pensamentos expostos em forma de literatura neste livro, mas que poderia levar em conceito para um artigo ou uma conversa, ou seja,estou construindo pontes para os pensamentos que quero expor às pessoas, sabendo que daqui por diante, ao fazer uma avaliação de minhas palavras,escritos, o farão sobre conceitos que fazem jus à minha ideologia em construção.

Logo, posso dizer que a palavra – Sankofia – é uma definição que encontra proximidade com a ideiade utopia, mas ao contrário deste termo, pode edeve ser alcançada já que tem a ver com umanecessidade de estabelecer a presença negra naesfera literária por nossas mãos, porém não semconsciência e muito menos sem a ideia depreservação de uma história, um legado, ou seja,não estou falando de algo que vai acontecer e quevai, se manter de forma etérea na consciência, muitopelo contrário, o cerne é a eterna vigilância dalembrança e uma intenção coletiva de preservação,até de quem se é. E sendo assim, um renascimentosankofico (pronúncia: sancôfico) é se reinventar, érever sobre uma identidade afrocentrada.

Sankofico/sankofica: derivada da palavra-provérbioafricano Sankofa (escrita ideográfica Adinkra) quesignifica “Nunca é tarde para voltar e apanhar o queficou para atrás”. Sendo assim, o termo pode servisto como uma analogia léxica que comtempla umanoção de resgate estrutural de intelectualidadeafrocentrada, e também, um exemplo em si daconstrução de um modo de pesar e expressar suaraiz africana em meio à cultura ocidental em que estáinserido, na qual sua base ancestral édesconsiderada em termos plenos de identidade (LuAin-Zaila, conceito elaborado durante meus estudossobre Afrofuturismo e Afrocentricidade no final de2017)Resumindo, Sankofia é uma obra deconstrução utópica-sankofica de representatividadeem inúmeros gêneros literários. Algumas intençõesestão em formato fechado com início, meio e fim,mas outras eu apresento em formato defragmentos, intenções a explorar, possibilidades queusam a literatura não apenas como umentretenimento, mas como uma ferramenta deaprendizagem e compreensão aprofundada doafrofuturismo.

***

ERA AFROFUTURISTA

Tenho a sensação de estar embarcando numaviagem espacial quando entro no super trem, comonaquelas de ficção onde só vemos linhas brilhantes.Mas para a minha sorte, aqui elas são coloridas econectadas a um céu azul, bem diferente da épocados meus bisavôs.

A minha ansiedade no dia era enorme, pois nainternet só existiam boas e ótimas avaliações, sóque tudo de modo generalista, dando a entenderque tudo muda de lugar e a única certeza é a de queseus visitantes se tornam uma melhor versão de simesmos, muito melhor. E deve ser verdade, pois éfamoso, ninguém dá spoilers e meu pai não vê ahora de atravessarmos a rua.

— Você com certeza vai amar este lugar.

Assim que colocamos o pé na área ampla, me vidiante de um prédio de quatro andares, espelhado,e com a longa faixada do primeiro andar todagrafitada, de um jeito muito legal, mas antesparamos diante de uma placa e meu pai apontoupara ela, esperando que eu a lesse e entendesseonde estávamos.

SPACE IS THE PLACE

(Espaço é o lugar)

Bem-vindo ao Centro Cultural do Afrofuturismo

Eu reconheci o nome, a mamãe fala sobre este lugarde tempos em tempos, mas sem maiores detalhes,pois diz que a primeira ida até lá é como um ritual deautoconhecimento. Ela disse que o local estáfazendo aniversário e recomeçando num novoendereço, maior, e pelo jeito é aqui. Sei quedemoraram alguns anos para coletar e organizar asobras doadas e o conceito multimídia ficoufantástico. Eu ouvi falar.

E eu reconheci a palavra – Afrofuturismo , a ideiade um modo geral tem a ver com a projeção depessoas negras no futuro: protagonistas de seusdestinos, se vendo capazes de salvar e mudarqualquer mundo, em qualquer época através desuas decisões e ações, se tornando heroínas eheróis de face negra diante de qualquer jornada quetomem como sua. Algo que parte da sociedade nosimpedia de ter através de inúmeros “mecanismos”.Isso eu comecei a aprender na escola e em casa,mas o papai disse que sentir a palavra é diferente desaber, e por isso, estamos aqui. É a minha hora desenti-la também.

— Então… como era ser negro na época que oAfrofuturismo começou? E nós, finalmente vencemos?

— Hummm… resposta nº 1 – Nada fácil, poisimplicava em se dedicar a um trabalho árduo dereconhecimento de si mesmo e do seu lugar nomundo. Insistiam em dizer que não tínhamos odireito a estar nele, o futuro. Porém, desde muitoantes desta palavra ou qualquer outra relacionada,existir, nós já lutávamos por um “dia seguinte”, muitoantes do nosso sequestro e abdução em largaescala, e principalmente após ele ter ocorrido. E…

— E a segunda pergunta, vencemos?

— Calma, eu ia responder a esta agora. Não, nósnão vencemos, porque direitos são fluidos,movem-se pela intenção e desejo das pessoas.Logo não é possível “vencer” e ganhar direitos depresente, mas, o conquistamos e mantemos,através da consciência, da atitude, e principalmente,da memória e lembrança do que é ser um – abduzido– e sendo assim, o que nos mantém seguros é oeterno compartilhamento destas memórias.Entendeu? É como se hoje eu despertasse otelepata que há em mim para guiar você, e aquidiante de nós está o seu rito de iniciação, onde…você será imbuído dos mesmos poderes que eu esua mãe temos, que todos aqui possuem. E quedaqui por diante, te ajudarão a perceber distorçõesno tempo, no espaço, nas falas, ou seja, agora vocêserá um aprendiz, podendo salvar qualquer um coma verdade. Hoje você entenderá tudo o que digo ede certa forma, nada te parecerá estranho, mesmoque desconhecido aos olhos.

Minha curiosidade só ficou maior e resolvi perguntarpor que tínhamos que ser sempre atentos. Nessemomento, meu pai se abaixou e disse que tudo tinhaa ver com uma palavra bem pequena, masimportante – poder – essa era a palavrinha pela quallutavam, “ eles ” para nos diminuir e silenciar, e “ nós ”para nos fazer representar e aparecer. Esse era omotivo, em parte, de eu viver numa outra realidade,em uma dimensão bem melhor, exatamente porquetínhamos alcançado poder suficiente para quepensassem duas vezes antes de qualquer coisa queviessem a cogitar.

— E como seu pai e um pesquisador, te afirmocategoricamente que você está vivendo sob a tutelada primeira Era Afrofuturista , resultado desta eternavigilância, algo que aprendemos em coletivo aproteger, e hoje, você se tornará integrante dapróxima geração de vigilantes telepáticos, assimcomo cada criança que já colocou os pés nestelugar, e como um dia sua mãe e eu tambémcolocamos, nesse grande sonho que na épocaocupava apenas um casebre. Na verdade, você já éum afrofuturista e nem sabe, mas, vai entender oque isso significa e como começou. Mas calma…respira, pois vamos aprender e nos divertir também,prometo.

Meu pai começou dizendo tudo aquilo com umsemblante sério, que depois foi se amenizado edando lugar a um sorriso, mas eu ainda estava sementender todas aquelas coisas em forma depalavras tão pequenas e fáceis de falar: Antes?Eles? Abdução? Poder? Geração? Vigilante?

Eu tinha tantas perguntas na cabeça, tantas, e nemtinha entrado no tal lugar ainda, mais perto a cadapasso que dava em sua direção e então bem naentrada, decidi, todas as minhas dúvidas iriamesperar até o final daquela aventura.

Assim que atravessamos as portas sensíveis aomovimento, me deparei na entrada com duasestátuas banhadas em bronze, a de uma mulher eum homem, cada um com um pequeno globoterrestre na mão, sustentando ao alcance dos olhoscomo se estivessem vendo além, e com osseguintes dizeres numa placa logo à frente.

Às primeiras negras e negros futuristas semnome desde tempos imemoriais na África eDiáspora. Nosso reconhecimento Aos sacrifíciose agradecimento pelo doar de suas vidas.

Fiquei sem reação, e ao meu redor, vi outrascrianças com a mesma expressão, acompanhadasde seus pais, só pai, só mãe, pai e pai, mãe e mãe.Percebi pelo olhar delas se cruzando com o meu,que também estavam com um sentimento aindasem nome no peito, com certeza imaginando o pesoque as palavras – sacrifício e doar – tinham naquelesdizeres. Por um instante, me senti como o papai, umtelepata dividindo através de um silêncio consensual,como ser negro, para nós, hoje é muito mais segurodo que a tempos atrás.

Senti que meu pai esperava que eu perguntassealgo, mas, apenas segurei forte em sua mão e eleentendeu que eu precisava de um tempo, pois decerta forma, eu entendia o que aquela frasesignificava mais do que gostaria de imaginar.

— Temos três andares para explorar, mas aindicação é que comecemos pelo terceiro, numaespécie de mergulho na própria história e daí, vamosdescendo as rampas. Tudo bem?

Respondi que sim, mas antes de subirmos asrampas, resolvi perguntar. — Por que a mamãe nãoveio?

— Bem, a sua mãe não veio porque ela é um tipo depossibilitadora de afrofuturistas de nível acadêmico equando surge um problema que não tem comoresolver, sem ser presencialmente, ela precisacomparecer, uma obrigação que assumiu comoreitora de uma universidade federal prestigiada. Emsuma, a sua mãe é uma heroína com umsuperescudo feito pelos deuses negros do Panteãodas Palavras que a escolheram para…

— Pai? A mamãe não é super-heroína e não temescudo.

— Ah… mas que criança pouco imaginativa. Tenhaem mente uma coisa, sua mãe não está com agente nesse exato momento por causa do seuimenso poder de argumentação ao se posicionar. Equando ela fala, as pessoas ouvem, respeitamquerendo ou não, o que tem a ver com aquelaquestão da eterna vigilância que te assustou umpouco, eu sei, fui meio enfático. Mas com o tempovocê vai entender e perceber que esse legadocompartilhado está mais leve para a sua geração,desde que saibam de onde vieram para além damatéria que constitui os nossos corpos, obrigaçãoda minha geração garantir a você.

Assenti com a cabeça e concordei, pois de algumaforma comecei a entender as metáforas do meu pai,um outro modo de dizer as coisas. Compreendi quea palavra “escudo” tem a ver com o currículo dela e otal “panteão” com todas as pessoas que elaestudou. Ah… e ser uma reitora defendendo oensino é como ser uma heroína negra. Viu? Estoupegando o jeito.

Enfim, começamos a subir a rampa lateral deentrada para o terceiro andar e imediatamentereconheci nas paredes vários símbolos, porém,todos do mesmo provérbio que eu conheço bem,seja em formato simples, estilizado, preto e brancoou colorido no espaço, entre constelações, sistemasplanetários, galáxias, como terra, céu, ar, fogo, pedraou metalizado. São todos Sankofa .

Se wo were fi na wo sankofa a yenkyi

Nunca é tarde para voltar e apanhar aquilo que ficou atrás

(pertence a um conjunto de ideogramas maiorchamado Adinkra que possui centenas de outrossímbolos, cada um com o seu pensamento).

Aquelas combinações imaginativas me animaram,mas na entrada do terceiro andar, meu pai parou eme disse que eu precisava entender que resgataruma história tem a ver com alegria e tristeza, orgulhoe revolta, dor e cura, até onde é possível. E que dalipor diante, seria assim. Eu sentiria uma confusão desentimentos e que naquele dia ou depois, qualquerque fosse a pergunta, dúvida ou pensamento, eunão deveria deixá-la para “atrás”.

Concordei e entramos no andar intitulado…

AQUI, NÃO HÁ MÁQUINAS DOTEMPO

Achei estranho, mas com certeza aquela era umametáfora que eu entenderia em breve,prosseguimos alguns passos até ele parar noprimeiro item, parecia uma pilastra de tamanhomédio com uma caixa transparente embutida, e nela,vi páginas que eu não sabia dizer que língua era,mas, ao lado existiam as traduções, que começamcom uma explicação, um preparo para o que eu leriaa seguir.

Não é possível conceituar porque agiam oupensavam assim, ou o que os motivava, apenas queera algo real e que sentiam ser uma missão “divina”concretizar os escritos — o racismo, antes do nomedesde a Antiguidade.

O Rig-Veda, composto entre 1000 e 500 a.C.,demonstra a impossibilidade de sustentar a tese deque o racismo era desconhecido durante aantiguidade 1 . (…)O hino a Indra 4.16.13 louva-o da seguinte maneira:“Você apagou os cinqüenta mil peles negras,destruindo seus castelos como se o fogo consumisseo tecido. ”

Li outras três páginas disponíveis e enquanto ofazia, parei para ouvir meu pai explicar a diferençaentre o significado da palavra raça hoje e o seusentido naquela época, assim como o que é racismoe porque uma educação não racista não erasuficiente para resolver o problema; tinha a ver compoder sobre o outro, em específico sobre nósatravés do tempo.

Bem ao lado das páginas, vi outra pilastra e nesta,encontrei monitores onde vídeos acompanhados defones explicavam vários conceitos pela voz econstrução teórica de pessoas negras históricas,ouvi tudo, mas eu gostei da simplificação que meupai fez para eu entender e me deixar sem medo, issome tranquilizou.

Ele me explicou que o conceito de raça na época erapseudobiológica, uma invenção para criar superiorese inferiores sob critérios falsos nada científicos queforam fortalecidos por outros campos, onde pessoascom o mesmo propósito se ajudavam e que naquelaépoca “ eles ” eram a sua própria escrita, razão, esendo assim, perpetuavam, deturpavam eescondiam as várias histórias africanas, suasgrandes civilizações, seus conhecimentos comomedicina, filosofia, matemática, física, astronomia,tanta coisa… e que esta Era de Sombras sobre ospovos negros, perdurou por séculos, mas não semresistência.

Ali, entendi plenamente o nome do andar e osignificado daquelas estátuas na entrada, para alémdos grandes nomes escritos na história que meu pairecitava com alegria e que mesmo não vencendo abatalha, todas as vezes, registraram na memória domundo seus levantes que nos deixaram legadoscomo Zumbi e Dandara de Palmares, Luis Gama,Luísa Mahin, L’Overture…

Nesse momento, a analogia, a metáfora da abduçãoganhou sentido na minha cabeça: ser retirado deseu lugar ou sob ele perder também sua liberdade,sentir o tempo parar e seguir num outro ritmo, ter avida quebrada, deixada para “atrás” sem escolha eentão ser inserido numa realidade totalmenteabsurda, que menospreza tudo o que vocêsignificava enquanto pessoa: O estranho numaterra estranha.

Conforme seguimos, notei algo curioso, os adultospareciam estar em conexão ao explicar osacontecimentos da época. Juro, como telepatas secomunicando, pois se um começa, os outros eoutras ao redor completam e dão exemplos de comoisso ou aquilo aconteceu, em perfeita sincronia econcordância, como por exemplo, nos disseramcomo a fisiognomonia desde a antiguidade foiutilizada como técnica de leitura de traços ecomportamentos, onde descreviam a si comosuperiores, na mesma proporção em que o resto domundo não branco era lido como inferior emconhecimento, índole e caráter, tudo voltado a umpropósito: construir desigualdades favoráveis para si.

“Impérios na África” , esse era o nome daexposição foto-auditiva que entramos em seguida.Imediatamente me deparei com grandesduplos-painéis, onde cada face apresentava umimpério, dinastia ou civilizações através de muitasfotos e novas descobertas arqueológicas. E foi aíque me dei conta da quantidade de organizaçõescomplexas, eram dezenas: Gana, Axum, Congo,Songhai, Yorubá, Nok, Zimbábue, Peul, Kerma(Kush), Meroé, Napata, Monomotapa, Benin, Kitara,Mossi, Daomé, Ashanti, Ruanda, Loango, Ndongo,Burundi, as dinastias egípcias e tantas outras emtantas épocas que foi impossível ver tudo; nãoconseguimos.

Atualmente, pelo o que entendi, existe umaforça-tarefa de pesquisa sobre pirâmides fora doEgito, tanto no país Mali que tinha um império com omesmo nome, quanto no Sudão (Núbia) dos ImpérioMeroé e Kush, país com a maior quantidade depirâmides do mundo e que sofreu com a ganânciade saqueadores, especialmente Ferlini que destruiuo topo de todas as pirâmides dali em 1834, mais decem (100). Hoje estas áreas são disputadas porpesquisadores de várias áreas e países queesperam até três anos numa fila de espera paraconseguir permanecer por lá seis meses estudandoos sítios arqueológicos.

Quando saímos dali, corri para a exposiçãoholográfica “Papyrus África” onde fiquei fascinadopelos inúmeros papiros matemáticos africanos,datados de no mínimo 1.200 anos antes de Cristo,ensinando como calcular volume, área de triângulo,as funções básicas de álgebra e trigonometria,integral e diferencial, fração… simplesmente incrível.

Ali fiquei sabendo que muitos destes conteúdostiveram seus nomes alterados e eram largamentereconhecidos pelo nome daqueles que os tomaramde seus países de origem, e mais, meu pai mecontou que muitos matemáticos ocidentais no séc.XIX, XX e XXI, mal informados ou intencionados,tinham a prática de chamar esta matemática-berçode incipiente, ingênua e até atrasada. Mas, o quenão se contava era que a linha evolutiva tinha sidoquebrada por invasões gregas, romanas, etc. eentão, estes conhecimentos eram destruídos outomados, reescritos e utilizados como “ deles ”,desenvolvido por “ eles ”.

Outra coisa que gostei muito foi o Memorial dosDefensores pela Liberdade que ocupa a parededo lado oeste inteira.

Nosso agradecimento aos negros e as negras queresistiram ao colonialismo e escravidão, que foramlíderes de organização quilombola e abolicionista, eque também demonstraram genialidade em inúmerasáreas (entre os tempos) como engenharia,agronomia, metalurgia, ciências biológicas, naturezae saúde, literatura, matemática, filosofia e educação,ciência espacial,…

Essas pessoas mudaram o futuro e graças a elas,eu aprendo hoje no colégio que “pi” é um número deorigem africana (mas que diziam ser grego) e quejunto com “phi” construiu pirâmides e outrasproezas. Eu ainda estava sonhando com os papirosquando meu pai me disse que devíamos entrar naexposição do Mali e perder o fôlego de vez. Nãoentendi na hora, mas quando entramos…

No Mali, fica uma cidade chamada – Timbuktu – enela, a histórica Universidade de Timbuktu (Sancoré,Djinguereber e Sidi Iáia), fundada em meados doséc. XII (12) com seus milhares de documentos quecontam muito desta época e da produção deconhecimento de vários cantos da África,reconhecida como patrimônio mundial da UNESCO,primeiramente traduzidos para o inglês, a língua dosfinanciamentos, mas que por pressão políticativeram que traduzir para o espanhol logo depois, epara o português foi um pulo…

Sua existência assegurada permitiu rearrumar vários momentos da história mundial que são estudados hoje, dando ao continente africano um novo status, indo além do papel de poço de recursos humanos e materiais (colonização). Hoje, nos livros, estudamos as rotas comerciais dali que foram não só importantes para o enriquecimento da Europa que escoou toneladas de ouro africano por lá,principalmente para a Espanha; mas dali, também saiu e muito, conhecimento para os grandes momentos da história européia sobre luzes, direitos,ciências e muito mais.

Quando a exposição terminou, eu ainda estavaaéreo e cheio de pensamentos na cabeça, maspude ver no rosto das outras crianças que osmesmos sentimentos que me circulavam, tambémas rodeavam: admiração e indignação diante dahistória.

Não tenho a menor noção de quanto tempo ficamosviajando por aquele imenso andar, mas, quandoestávamos para sair, me sentia estranho, pois nele vio pior do que uma pessoa pode fazer à outra, masacima disso, a grandeza de nossa contribuição aomundo.

Eu não queria sair dali, mas, ao mesmo tempo mesentia cansado, só que não tinha a ver com o meucorpo. Sabe… era outra coisa, algo me incomodavade um jeito que não conseguia explicar. Acho queera um sentimento e eu não tinha palavras para ele,mas meu pai sabia o que era e decidiu quedeveríamos dar um tempo, respirar depois de todoaquele passeio por uma imensa história que aindatinha muito a me contar.

Ele cogitou que deveríamos lanchar e topei no ato,mas, depois segundo andar. Eu mal podia esperar.

Antes de sairmos, fomos ao setor de itens paravenda e lá fiquei uns vinte minutos indo e vindo entretantas coisas extraordinárias. Por mim levava tudo,mas o papai freou meu entusiasmo acelerado e mefez focar em quatro réplicas de itens históricos queiriam para casa comigo. E depois de muito pensar,escolhi:

O Papiro de Ahmes (erroneamente chamado deRhind), escriba egípcio que refazia os papiros deconhecimento em sua época, talvez ajudando aresolver as questões anotadas também, mas o legal,é que um muito especial com 85 problemasmatemáticos (de um anterior reescrito por ele) foiencontrado. Ele foi datado de 1.700 a.C. pelomenos, incrível, de 5,5m de comprimento por 0,32mde largura, muito legal; queria levar todos os outros,mas não tenho parede suficiente.

E a Linha do Tempo dos Povos Africanos ? Vocêsprecisam ver e ler, foi produzida por AbdiasNascimento e Elisa Larkin do IPEAFRO, e vai de4.500 a.C. até 2.000 d.C. com material de leitura,cheio de informação!;

Já o Tabuleiro de Senet , de XIV a.C. é um jogomuito legal de inteligência que vou aprender e levarpara o colégio.

E o Osso de Ishango , uau… tem uma réplica de 90cm aqui e também em seu tamanho natural (ÁbacoIchangi), um artefato com mais de 20.000 anos deidade. Será que era uma calculadora? Não sei.Ninguém descobriu ainda. Pensar nas possibilidadesé legal, mas, a história que cerca a sua descoberta ébem terrível: foi retirado do Congo que estava sobcolonização belga, outra palavra para descreverexploração em larga escala de tudo, de gente arecursos. Meu pai não queria, mas permitiu que euvisse algumas fotos do terrível capítulo da colheitade mãos e pés tanto de adultos quanto de criançascongolesas pelos belgas invasores. Não pude ouviros vídeos, mas sei o que significa a palavragenocídio e ali… aconteceu.

Ah, faltou dizer que o governo congolês na segundametade do séc. XXI (21) foi ao Tribunal de Haia(Convenção de Haia) e obteve a repatriação doÁbaco Ichangi e outros itens levados. Meu pai disseque isso só foi possível através de pressões políticase humanitárias, que possibilitaram a compreensãode que bens culturais tomados sob “dominaçãocolonial” deveriam ser vistos no mesmo contextodaqueles pilhados em guerras ou adquiridos semreconhecimento pátrio, ou seja, sem que o país em“regime democrático” os tivesse doado ou vendidoem condições legais. É meio complicada essa coisatoda, mas é bom saber que acontece e amenizauma “dor histórica”, outro ensinamento importante,mas acho que vai além, porque eu sinto algo sobreisso, um alívio que também me deixa feliz.

Foi tranquilo e não levamos mais que 10 (dez)minutos para comprar o lanche e conseguirmoslugares para sentar. De início ficamos em silêncio,mas meu pai parecia esperar que eu dissesse algoprimeiro, fizesse contato, e finalmente fiz.

— Tem tanta história africana por todos os cantos domundo e eu nunca me interessei tanto por sabermais…

— Isso é normal, não saber de tudo, mas definitivamente seria um erro acreditar que nãoexiste nada, nenhuma história e isso, era recorrente nos séculos XX (20) e XXI (21) onde ainda nos levantávamos para correr atrás do prejuízo numa pista muito desigual e cheia de buracos na forma de discriminação direta, indireta, desrespeito aos direitos e à identidade racial, étnica das pessoas. E isso você vai ver no próximo andar, da marginalidade à insistência e construção de caminhos próprios. E você… está se sentindo melhor agora?

— Sim, mas… tudo o que fizeram, não sei… senticomo se pudesse ter vivido aquilo. Deu medo pai.

— Eu entendo e conheço esse sentimento, pois depois que entendemos o que é, e seu significado,ele nunca mais nos deixa. O nome dele é pertencimento , para alguns é étnico, mas no caso de pessoas negras chamamos de “racial”, mas, no sentido que te expliquei assim que entramos aqui.Lembra?

— Sim, eu entendi bem.

— Isso mesmo e não usamos outra palavra de propósito, pois isso sempre nos dá a chance de conceituar o significado da palavra raça em seus dois lugares no tempo: no passado, quando foi conveniente para desqualificar e agir sob a população negra. E no presente onde há tempos,relemos os propósitos de novo e de novo,mantendo-a como um conector histórico capaz de seguir uma imensa linha de acontecimentos e explicar muita coisa.

— Certo, mas o que é pertencimento racial? Defato?

— De modo simples, posso dizer que tem a ver com toda a carga histórica que temos e o que sofremos,o quanto lutamos, então… quando vemos algo acontecendo de certo ou infelizmente errado, com uma pessoa negra por ela ser negra, o que significa ser e pertencer a este grupo, sentimos que poderia acontecer conosco também. É como se… a única coisa que impedisse – um fato – de estar ocorrendo comigo ou você, fosse o tempo e o lugar,fisicamente falando.

Depois de explicar, meu pai ficou me olhando e tentando perceber se eu tinha entendido o que disse, e sim, entendi perfeitamente e sorri, pois estava feliz por encontrar uma palavra para como me sentia, pensando em relação a tudo que conheci e vi até aquele momento.

E realmente, não há máquinas do tempo .

Ficamos ali mais quinze minutos enquanto eu acessava a rede de conteúdos e mostrava para o meu pai cada detalhe.

E enfim, era hora de seguir, descemos a rampa e lá estava outro nome inusitado…

ALIENS, VOCÊS DEVIAM TERPREVISTO NOSSARESISTÊNCIA…

Meu pai já ia entrando quando percebeu que eu ainda estava lá, olhando para aquela frase tão…realista. Agora eu começava a entender o sentido de nossas metáforas bem mais rápido, e não conseguia deixar de pensar… será que acreditavam, de verdade, que não iríamos resistir e simplesmente sumir como dunas ao vento? Sim, eles acreditavam nisso, mas fizemos questão de provar que não seria assim…

Esse andar é totalmente voltado aosacontecimentos dos séc. XX (20) e XXI (21), e issosignifica que de agora em diante eu vou conhecer osfatos com foco nos levantes negros de resistência emudança, ou seja, a construção do futuro que vivo,hoje, pelas mãos dos que vieram antes de mim.

Assim que entramos, um painel de fotos começou adançar nos meus olhos. Eram cientistas, inventorese inventoras negras de todo o canto e época,idealizadores de coisas simples do cotidiano ainventos extraordinários, como o afrocanadenseElijah McCoy na época das máquinas a vapor,Granville T. Woods com seu filamento de lâmpadaselétricas e muitos outros dispositivos eletrônicos,Shirley Jackson que revolucionou atelecomunicação, da discagem à fibra óptica. Étanta coisa legal e eu uso muitas delas todos osdias:

Geladeira, batedeira de ovos, cortador de grama,papel, escova de cabelo, lavatório para cabelos desalão de beleza, galochas, cadeado, bomba deinseticida, tampas para garrafas, cadeira dobrável,carrinho de bebê, colher de sorvete, espremedor delimão, pilão, lampião, caneta tinteiro, elevador, pá delixo, tábua de passar roupa, esfregão, rolo paramassa, carimbo, irrigador de grama, triciclo,sanitário, extintor de incêndio, ar condicionado,secadora de roupas, câmbio manual e automático,vela de ignição, bonde, calculadora, óculos deproteção, óculos 3D, semáforo, trem elétrico,telefone, telefone celular, controle remoto, microfone,estetoscópio, máquina de escrever, guitarra, vídeogame, microchip de computador, disquetes e muitomais. 2

E foi demais rever a história dos irmãos Rebouças,engenheiros da estrada de ferro Curitiba –Paranaguá, portos importantes no Rio de Janeiro,além de outros feitos.

Meu pai disse que esse é o andar preferido daminha mãe, e que ela foi uma das incentivadorasdeste andar, inclusive com a doação de material deacervos particulares. Saber disso me encheu deorgulho e um dia serei um afrofuturista das letrascomo os meus pais, os novos escribas da históriacontemporânea negra.

Dali, seguimos para o próximo ambiente, o espaçoResistências Seculares , e assim que entramos,ouvimos vozes conhecidas. Aquela foi uma felizsurpresa, as mães do meu amigo estavampasseando por lá também com ele, que ficou felizem ver um rosto amigo.

— Somos suspeitas para falar, afinal somosjornalistas, mas este primeiro momento é o nossopreferido.

— Sim e como vocês, também estamos trazendonosso filho pela primeira vez – disseram às pessoasque as ouviam.

— Minhas mães são expert no assunto que estáaqui.

Meu pai achou perfeito e pediu a elas que fossem asanfitriãs daquele primeiro salão – A Imprensa Negra,que não era só um acúmulo de jornais digitalizados,mas um retrato da história da resistência da “ gentede côr ”, que é como a população negra erachamada no início do século XIX (19). E assiminiciamos… parando no primeiro registro de jornal – OHomem de Côr – lançado em 1833 por Francisco dePaula Brito num Brasil imperial e escravista.

Conforme íamos avançando, cada vez mais euficava fascinado pelos atos de resistência emtempos tão árduos e difíceis por todo o país, etambém, com as ações de incentivo à alfabetizaçãocomo fez a Sociedade Beneficente Luís Gama sócinco dias após o ١٣ de maio , a incrível organizaçãoda Frente Negra Brasileira com suas dezenas deassociações educativas, culturais e tantas outrasações, que buscavam mudar o destino semhorizonte da gente negra ano após ano, mas nãoera fácil diante do racismo, dos poucos recursos edas instabilidades políticas.

Uma das coisas que elas disseram e fizeramquestão de frisar para nós dois, é que as palavrassão um instrumento importante de poder, sendocapazes de uma sutileza massacrante em gotas oude uma única batida feroz de martelo. E por isso,lutava-se no século XX (20) e XXI (21) para que asmídias e conteúdos de um modo geral parassem deescrever, por exemplo, “escravos libertos” quando ocorreto seria dizer “negros libertos”. A insistência nouso do termo escravo ao invés de negro escravizadodeixava à vista uma naturalidade assustadora.Então, imagine como uma criança negra se sentiaao ter que ouvir que seus antepassados eram, só, esomente escravos, nunca pessoas: o escravo isso,os escravos aquilo, os escravos fugidos, os escravoslibertos. Isso com certeza era horrível.

Horrível… essa é uma palavra boa para descrever umevento, o Congresso das Raças (Londres, 1911),onde representantes brasileiros juraram ser capazesde fazer os negros do Brasil pós-abolição sumiremem 100 anos? Pois é… acreditavam sim, nós lemos odiscurso e deu calafrio, pois tentaram a sério com aimigração europeia, a eugenia racista, a democraciaracial, a ditadura e tudo o mais.

As mães do meu amigo deram um show e os outros pais aproveitaram a viagem nas informações e curiosidades, com direito a palmas no final pela incrível exposição. Foi uma viagem e tanto, e o salão seguinte, intitulado Persistentes Icônicos , meu pais e prontificou a apresentar, todo animado.

— Vocês vão adorar… totalmente dedicado à pessoas que revolucionaram a história e moldaram oque viríamos a chamar de “pensamento negro” de seus muitos lugares de atuação.

Abdias Nascimento, Clóvis Moura, Luis Gama, Lélia Gonzalez, Kabengele Munanga, Maria Firmina dos Reis, Luiza Bairros, Beatriz Nascimento, SueliCarneiro, Marcelo Paixão, Cheik Anta Diop, LuisaMahin, Carlos Moore, Milton Santos, Aimé Cesaire,Guerreiro Ramos, Angela Davis, Cuti, Joel Rufino dosSantos, Zózimo Bulbul, Nei Lopes, Alberto GuerreiroRamos, Teixeira e Souza, Charles Mills, JamesBaldwin, José do Patrocínio, Lima Barreto, Tereza deBenguela, Chinua Achebe, Donato Ndongo, WoleSoyinka, Mandela, Toni Morrison, Steve Biko, RosaParks, Martin Luther King, Ferréz, Solano Trindade,Ruth de Souza, Frantz Fanon, Bel Hooks, Paulo Lins,Sebastião Rodrigues Alves,…

E na sequência, vários painéis foram dedicados àsorganizações quilombolas como Palmares, Revoltade Búzios (1798), Revolta das Carrancas (1833),Revolta dos Malês (1835), Insurreição do Queimado(1849), Revolta da Chibata (1910) e ao TeatroExperimental do Negro (1944-1961), a primeiragrande organização artística, uma companhiafundada por Abdias Nascimento, mas que mantinhatambém um caráter político de conscientização dapopulação negra através de debates, cursos dealfabetização e também de atuação teatral paraseus participantes.

Já o último painel daquela sessão era diferente,falava de Marcos Sociais & Legais , onde ouvimosfalar do – Projeto Unesco – uma ampla ação depesquisa realizada no início da década de 1950, querevolucionou ao dizer que havia no país a existênciade um “problema racial”. A “democracia racial”brasileira era um mito. Ali tivemos acesso adocumentos digitalizados de várias épocas, como aConvenção da ONU sobre a Eliminação de todas asFormas de Discriminação Racial (1966), Lei Caó(1989), Declaração de Durban (2001), Lei 10.639/03,Estatuto da Igualdade Racial (2010) e também deoutros países, tanto favoráveis quanto racistas. Doisbons exemplos são a Lei de Terras (Brasil, 1850),que impedia negros de comprar terrenos, e as leisJim Crow nos estados ao sul dos Estados Unidos,que pregaram a segregação racial de 1876 a 1965.

Enfim… encerramos aquele tenso circuito com omeu pai, que foi um guia voluntário tranquilizador,assim como as mães do meu amigo e alguns outrospais presentes. Estávamos bem, mas a últimasessão do andar não seria nada tranquila, bemvisível no rosto dos adultos e aquela palavra… eusabia o que significava – Ditadura, mal me quer(ia) .

— Desculpem o atraso de horas, mas acho quecheguei bem a tempo de dar uma das minhasmelhores palestras.

Eu não acreditei, achei que não daria tempo, mas aminha mãe estava ali. Corri e a abracei sem pensarduas vezes. O perfume dos dreads dela caídossobre a minha cabeça eram como abraços extras, osmelhores do mundo, e meu pai adorou a surpresa.Ela conseguiu chegar antes do previsto.

— Mãe! Que bom, deu tempo.

— Eu não perderia a sua iniciação na extensahistória dos nossos antepassados e afrofuturistaspor nada. E seu pai me manteve informada o tempotodo.

Aquilo foi demais e os outros pais e mães ficaramsurpresos, pois minha mãe é meio que uma…celebridade das letras, acho que tem a ver com osprêmios Jabuti e o Pulitzer que ela ganhou por seuslivros de ficção histórica. Então, o que não faltouforam pedidos de fotos e autógrafos, até o pessoaldo local aproveitou, e olha que engraçado… ummundo de tecnologia e minha mãe jamais deixou deter papel e caneta ao alcance.

— Muito bem visitantes, gostaria de ser a pessoaque vai guia-los por esse momento da históriabrasileira, um dos períodos de maior vigência doautoritarismo na era moderna, e também o períodode maior enfrentamento e organização do que viria aser chamado oficialmente de “movimento negro”. Ecomo bem diz o nome deste andar: Eles deviam terprevisto a nossa resistência .

Começamos a caminhar rumo a este último espaçoe é incrível, minha mãe realmente tem o poder defazer todos ouvirem o que ela tem a dizer.

Assim que entramos, ela apontou para uma galeriadigital com imagens de todo o tipo: militantes noexílio, militantes vigiados aqui, fotos de reuniões,bailes soul, eventos, jornais comuns com algumanotícia relacionada, e especialmente, jornais negros,clandestinos e fora do circuito oficial como o Árvoredas Palavras (SP), Versus (SP), Tição (RS), Jornegro(SP), Sinba 3 (RJ), O Quadro (1974), Nagô (1975) emuitos outros, mas o que mais se destacou foi o doMUCDR 4 por ser um jornal nacional de umaentidade importantíssima na época. E na galeriatambém havia o nome de organizações como oIPCN 5 , CECAN 6 , CEBA 7 , etc.

Minha mãe explicou que apesar da repressão,aquele foi um momento de crescimento das ações negras de resistência.

— Vários ativistas desta época já eram “frutos” deoutros movimentos e tinham na consciência nãosomente a luta antirracista, mas, a luta pelaintelectualidade e literatura negra. No cerne, estestrês elementos tinham muito em comum.

E sim, minha mãe contou que um dos lemas daquelaépoca era de que o país era uma democracia racial,que é exatamente o que a pesquisa da UNESCOafirmou que não existia, anos antes. E mesmoquando proibiram as organizações e reuniões, osmovimentos negros se reuniam, debatiam e insistiampor todos os cantos do país. Nessa época, novosmovimentos dos movimentos, também surgiram, emespecial, de mulheres negras que estavam no últimodegrau dos direitos, mas, dispostas a mudar essarealidade o quanto antes.

E não demorou, para que toda essa movimentaçãofizesse “ eles ” verem as organizações negras como –subversivas e agitadoras da ordem – o quesignificava que seriam investigadas, seus membros eorganizadores vigiados, e cada ato seria registrado eavaliado. “ Eles ” não gostavam das denúncias sobreas mazelas do país, não gostavam dos manifestos,textos, jornais e por isso vigiavam, mas quando nãoeram suficientes, eles iam atrás das pessoas queconsideravam perigosas à “pátria harmônica” elevavam para interrogatórios, maltratavam, prendiame às vezes, estando presos ou livres e andando poraí, um dia qualquer alguém nunca voltava para casa.

Mais à frente, num monitor, vimos trechos dedepoimentos e centenas de páginas de relatórios efichas que fizeram durante a ditadura. Pensar emtudo o que passaram naqueles tempos e depois, meassustou, me senti “em perigo” como se estivessenaquela época, pois, mesmo quando a democraciaveio os direitos e o reconhecimento dasdesigualdades não vieram juntos. Apertei a mão domeu pai e ele percebeu, mas disse que eu tinhasorte, pois o que só ouvia a minha mãe falar foi real,bem real um dia e ali, naquela época afrofuturista euestava a salvo.

Então… de certa forma eles lutaram por mim, mesmosabendo que nunca me veriam nascer ou meus paisou ninguém aqui. Então… eles lutaram pelo futuro degente negra que jamais saberiam os nomes. Aquilome deu um nó na garganta e quando estávamospara sair de lá, resolvi dizer baixinho para algunsdeles, caso estivessem por ali ouvindo. Obrigado eobrigada por tudo .

E concluímos o segundo andar com… algumasnuvenzinhas na cabeça e interesse em entendermais. Nesse ponto, os guias do andar nos indicarama livraria com atendentes especializados queresponderam algumas dúvidas, o que incluía umapergunta feita por um casal de pais com a sua filha,eles queriam saber sobre a literatura negra doperíodo da ditadura, e a guia informou que tinham oslivros certos para sanar as dúvidas, mas que seriabom respirarmos e buscar fôlego para o que estavapor vir.

Eu concordei e pedi chocolate quente e livros extrasantes de embarcarmos na última grande aventurado dia.

O FUTURO É O LUGAR

E ESTAMOS NELE, PRESENTEE PASSADO TAMBÉM

— Eu entendi o nome do andar? É uma metáforasobre o futuro que chega aos nossos dias de hoje edepois vira passado e começamos de novo. É issomãe?

— Sim, mas diz um pouco mais… se almejamos o futuro, precisamos aprender com o passado, que já o foi, e escrever o presente com a intenção de que seja um futuro que ainda não se tornou. Resumindo,devemos aprender com que veio antes e com a história, pois não existe nada mais sábio que os dias que já se foram.

Hummm… acho que entendi o que a mamãe disse, e se não, esse andar inteiro vai me explicar, mas de imediato me chamou a atenção os dois bustos reais e nada digitais na entrada, e que diziam…

Antônio Gonçalves Teixeira e Souza

O Filho do Pescador (1843)

O primeiro romance-folhetim brasileiro nasceu das mãos de um homem negro.

* * *

Maria Firmina dos Reis

Úrsula (1859)

O primeiro romance feminino onde a humanidade

negra em plena escravidão é exposta nasceu das mãos deuma mulher negra.

Meu pai disse que aquela era uma justahomenagem e que ser um afrofuturista ou umafuturista negra, era um estado interior, onde anegritude plena só pode ser alcançada quando vocênão tem mais dúvidas do que o constitui, ou do quevirá a doar ao mundo enquanto uma pessoa negra,gente negra, pessoa de cor. Não importando a linhado tempo em que estamos, simplesmente será oque somos, e isso fará toda a diferença.

O primeiro espaço – Arte Negra – parecia umagrande exposição 8 de arte, onde me senti em casa.Soltei a mão da minha mãe e comecei a viajar poraquela imensidão de fotos de pessoas negraspintoras, escultoras, artistas plásticas e suas obrasem tinta a óleo, negativos, madeira, pedra-sabão,graffite e outros elementos da época colonial atéfinal do séc. XXI. A maioria delas ilustrava a vidacotidiana, a natureza, rostos livres, inspiradores oucativos de senzalas e periferias nos encarando oucontemplando o dia, o horizonte, um sonho, o futuro,talvez? Não sei, mas, ali fiquei perdido entrepensamentos de como aquelas presenças negrastinham sido apagadas da história brasileira.

Minha mãe lembrou-me de que na época daabolição oficial, no máximo, só vinte por cento dapopulação negra ainda era escrava, e que pressõespolíticas, ciclo de crises de produção e várias outrascoisas, que eu não entenderia se ela fosse meexplicar tintim por tintim, já tinham levado aescravidão para o seu fim eminente, não porconsciência humana, mas porque não era maisrentável. E isso me fez pensar no primeiro andar ecomo o que diziam não tinha o menor sentido diantede tanta beleza, exemplos e produções de cair oqueixo.

Eu estava pisando em nuvens de aquarela quandoentramos em – Literaturas, negras, histórias,literaturas – minha mãe disse que eu deveria encararessa viagem literária como um legado, não apenassobre negros escrevendo em tempos difíceis, masinsistindo em escrever e provar que existiam emtempos que não eram bem-vindos ao futuro.

— Eles escreveram sabendo que um diaresgataríamos suas histórias, de pessoas capazes,e as únicas interessadas em expor a beleza e averdade da vida dos negros, da vida deles e danossa própria, mesmo que ainda não vivida. É umaparte do todo e com o tempo, vamos vendo as linhasemaranhadas de nossa história ganhar plenosentido.

Eu concordei e no fundo, eu já começava a ver epensar sobre isso. E seguimos… ali estavam, agorapainéis de escritores e escritoras 9 .

Luiz Gama (Orfeu de carapinha), Auta de Souza,Machado de Assis, Cruz e Sousa, Augusto dos Anjos,Carolina Maria de Jesus,Rosário Fusco, Muniz Sodré, Nei Lopes, ConceiçãoEvaristo, Ana Maria Gonçalves, Lino Guedes,Oswaldo de Camargo, Éle Semog.

Já meu pai disse que a presença literária negraconseguiu exigir com mais vigor, reconhecimento dasua produção a partir da década de 1970, pois omontante de pessoas negras articuladas por direitosera muito maior.

— Esse é o painel de produções destacadasdaquele período… aqui, manifestações da literaturanegra: os Cadernos Negros com sua antologia anual10 , jornais do MNU e outras articulações como aVersus 11 , marcaram a época e a própria literaturanegra de essência marginal e periférica, que estavafora dos interesses do mercado literário por ser feitapor pessoas diferentes deles e, trazer vozes e temasfora da sua realidade (escrita pelos olhos de quemvive à margem da sociedade e dos espaços depoder). Então, era comum as produções simples, dexerox, edições do autor, de mimeógrafo 12 e outraspoucas destacadas pelo mercado. Tudo issofomentou, também, o surgimento do propósito domercado independente como algo concreto, indo deautores independentes a editoras pequenas.

Não era nada fácil, mas, era o que precisava serfeito e com o tempo, outra necessidade veio à tona,a produção cultural periférica, dentro das periferias.E nunca mais pararam de reagir, produzir e fazer adiferença.

Desta época, me chamou a atenção a vida deCarolina Maria de Jesus 13 , moradora de favela,catadora e apaixonada pela literatura com seusescritos em cadernos jogados no lixo. Ela chegou afazer sucesso, mas tudo o mais que aconteceu comela, é triste, de gosto amargo, e me deram asensação que reconhecer sua obra, seriareconhecer ela e todos os outros, negros e negras,como pessoas capazes de fazerem parte daliteratura brasileira.

E no final desta viagem, uma surpresa, um monte dereproduções de conteúdos daquela época paraconhecer e entender.

— Mãe, não seria ótimo se eles lá no passadopudessem receber notícias do futuro pelo quallutaram?

— Seria sim. E eu adoraria dizer a eles que vivemosno futuro que eles imaginaram, onde a utopia negranão está fora de nós, mas dentro, e que jamaispoderão nos arrancar isso do peito.

Fiquei pensando no que a minha mãe disse e meupai riu, ela sempre tem um pensamento que faz agente ficar pensando, ali, perdido nas palavras. Eentão meu pai…

— Ei, acorda… e vai lá aproveitar, pois daqui a vinte minutos embarcaremos no maior experimento negro da história.

E seu nome faz sentido para mim.

– AFROFUTURISMO –

A Soma de Todos os Passos

Em todos os Tempos

Pelo tamanho do local, dava para perceber queaquele era o maior espaço dali, e já na entrada, elefazia valer o seu nome, pois não tinha uma únicaentrada e sim cinco. Meus pais disseram que nãoera um labirinto, fielmente, a soma de todos ostempos. Aquelas entradas não eram fixas, então oque eu visse hoje, não veria da mesma forma emnenhum outro dia novamente.

Eu já estava adorando.

Escolhi a segunda da esquerda e lá fomos nós porum corredor arredondado, que misturava imagensfixas como num mosaico com trechos de imagensem movimento, e realmente, ali tudo se misturava,criando uma espiral de acontecimentos, e derepente, ouvimos uma voz e esperamos suaorientação.

Mude… interaja com a obra. E faça o seu próprio caminho.

O labirinto está vivo e não nos importamos com a ordem,mas com a certeza de que você precisa saber.

Toque a história.

Toque os acontecimentos.

Altere a ordem dos fatores, mas mantenha-os dentro devocê.

— E o que isso significa? Então eu posso…

— Pode e deve. Estamos numa imensa metáfora sobre como olhar os acontecimentos e como cada um nos toca e agora… você pode tocar eles de volta– meu pai riu e tirou uma das imagens da parede e lá estava a mágica. A imagem mosaica descia,deixando um espaço vazio, depois, ele reencaixou apeça retirada.

— Então… eu posso mexer nelas? Mãe, elas nãocaem…

— Não caem e é isso mesmo. Sim, você está num imenso mosaico vivo e arredondado. Divirta-se!

Ah… eu não pensei duas vezes, me diverti trocandoas peças e lendo atrás sobre o que era e a quetempo pertenciam. E todas as pessoas queentraram naquele corredor estavam fazendo omesmo que eu, experimentando o lugar dos fatos econstruindo o próprio caminho.

Ficamos nos divertindo ali uns dez minutos e nasaída que concentrava todos os corredores, medeparei com a identificação de quem fez algo tãolegal.

Artista ……………………………..

Segunda fase afrofuturista (Brasil)

Arte sobre mosaico e estrutura

“Aquele zine afrofuturista que ganhei na escola mudou aminha vida.

Nunca tinha visto negro de periferia sendo herói de nada.

E agora, eu sou exemplo para os pequenos da minha área.

Se eu sou hoje, eles e elas serão amanhã…”

E mais, havia uma cortina de búzios muito especialfazendo as honras na entrada, pois nela, prestandoatenção era possível ver uma paisagem comcrianças negras correndo, como se nosconvidassem a segui-las. Era como uma miragemem movimento, que você vê e não vê ao mesmotempo, algo sem igual.

Artista……………………………..

Segunda fase afrofuturista (Brasil)

Arte sobre búzios com pintura

“Nunca imaginei fazer arte e viver como artista. Ninguém

da minha família conseguiu fazer algo parecido, muitosqueriam, mas

a dura realidade exigiu deles, segunda a sábado e,domingo e feriados alternados”.

Eu não sabia o que achava mais admirável, as obrasou os depoimentos. As duas coisas eram demais,mas eu nem tinha arranhado a superfície daqueleplaneta arte. Estava só começando, o que percebiassim que entramos naquela primeira área.

Eu estava diante da – AfroSoundBeat – espaçodedicado às várias possibilidades de composiçãomusical 14 do afrofuturismo. As pessoas colocavamos fones, ouviam as músicas e até dançavam aosom de álbuns de artistas, trilhas sonoras de filmes,outras específicas para exposições das maisvariadas, experimentais, inspiracionais e até paralivros, algo que se tornou comum e com direito àcategoria em premiações musicais. Até hoje é assime o vencedor do ano passado foi…

Artista ……………………………..

Terceira fase afrofuturista (Brasil)

categoria Livro Som do Ano

Álbum-livro………………………………….

“Lembro-me dos meus avós contando o rebuliço que foi terlivro assim, ainda usavam QR code. Eles me deram umafoto da pequena livraria de autores negros no centro do Pará. Ela está no meu estúdio e inspirou meus pais que meinspiraram também ”.

E se eu estava em um sonho, não ia acordar sembrigar.

Já a segunda área se chama – Experimentos Afrofuturos – totalmente voltada à arte moderna afrofuturista. Ficamos ali um bom tempo alternando entre salas iluminadas com obras de vários artistas em tela, colagem, escultura e ambientes de pouca luz com obras tecnológicas ou montagens que precisavam se destacar. E no final, minha mãe apontou para uma, no último ambiente, a peça mais famosa dali.

Artista……………………………..

Primeira fase afrofuturista (Brasil)

Arte sobre metal, madeira e Etc. com elementos das

manifestações afrobrasileiras

“E pensar que tudo começou com aquela pintura descritanum conto de suspense sobre o último quadro – A UtopiaMaracatu – a restar no mundo ser de um artista negro,

conterrâneo meu. Pois é… não sosseguei até produzir umparecido com tudo o que eu achava de útil. E foi assim,acreditei e meu destino mudou a partir dali”.

Nada mais, nada menos que a primeira e uma dasmais visitadas obras com lugar cativo no MuseuGuggenheim de arte moderna em Nova Iorque.

Tudo o que vi até ali me deixou pasmo, tantas ideias,pensamentos, mas o espaço seguinte ainda tinhaum lugar especial em tudo isso, tinha a história emmovimento 15 , organizada de modo alongado emestantes-caixa transparentes e em cada uma…

— Uau… eu não acredito. Pai! Mãe! Isso é sério?

— É e muito. Esta sala abriga as primeiras ediçõesde inúmeras obras lançadas na América Latina,pertencentes ao Primeiro Ciclo Afrofuturista , no séc.XXI 16 .

— Sim. Dedicaram muito empenho em reunir esteacervo único e alguns com autógrafos, tanto deescritoras e escritores, quanto de cineastas,jornalistas, pesquisadores, roteiristas, desenhistas,músicos. Enfim… aqui nesta imensa sala, tem umexemplar que ajuda a compreender o que sustenta opensamento, a filosofia, a Era Afrofuturista .

Eu estava diante de raridades como revistas emquadrinhos (HQ), esboços originais de heróis,cartazes, livros e roteiros (filmes, peças, curtas)premiados de inúmeros gêneros. Era tanta coisalegal que dava vontade de morar ali, mas foi quandome dei conta, que tudo aquilo fazia parte da minharealidade. Eu já morava nela.

— Pai! Aqui tem o roteiro do filme ……………………………………!Eu não acredito!

Artista ……………………………..

Primeira fase afrofuturista (Brasil)

Ficção Científica – recorde de bilheteria no Brasil

Blockbuster de status internacional

“Representatividade é poder, algo que não podemos abrirmão de ter e hoje sou quem sou e estou aqui porque outrose outras ensinaram a mim e a tantos e tantas antes de mimque rostos negros tem valor, história para contar e podeminspirar qualquer um”.

— É isso mesmo. Seus bisavós assistiram eufóricos.Foi uma reviravolta na mente das crianças, poisagora elas tinham como ideal, heróis e heroínasnegras que falavam a sua língua, e que falariam a demuitos outros países também.

— E não podemos esquecer o impacto de Nollywood17 desde os filmes experimentais até as distribuiçõesinternacionais aclamadas.

— Mãe … eu andei tudo e não achei os TrêsClássicos. Onde estão?

— Boa pergunta.

— Sério. Eles não estão aqui.

— Verdade…

— E onde estão? Mãe…

— Segure a sua ansiedade e eles estão logo àfrente, no último espaço desse andar.

— Isso e fecharemos com honras nossa viagemafrofuturista. Preparad x para o último grande salto?

Eu respondi sim e seguimos em frente.

Era a hora de finalizar aquela jornada, a mais incrívelque uma pessoa pode viver, a de se conhecer; e foiquando entendi porque não havia tour virtual no site.É impossível recriar digitalmente o contato, asurpresa, o tato das coisas e o que sentimos a cadapasso ali dentro, não importa que óculos derealidade virtual inventem. Não seria real.

Bom… para alcançarmos os três clássicos, tínhamosque atravessar um corredor que estava sendocontrolado por atendentes. Esperamos uns vinteminutos e na liberação, elas nos deram lanternas euma caneta especial para – encontrarmos osmistérios sobre os mistérios – e valeu a pena, pois oque estava à nossa frente, na verdade era outradimensão, obra de arte e poesia.

Entramos num ambiente com pouca luz, e cheio demicro luzes espalhadas por todos os lados, indo dasparedes aos painéis arredondados que pareciamnão ter qualquer organização horizontal, vertical,inclinada ou de tamanho, mas não demoramos aperceber que estávamos errados e com um olharmais atento, acompanhado de um passo atrás,revelava-se a genialidade da coisa. Tudo o queprecisávamos era de uma caneta e a tínhamos.

Aproximei-me da parede e comecei a ligar os pontosdo exterior para o interior. Todo mundo começou aver alguma lógica e rapidamente deduzimos o quãoextraordinário era tudo aquilo.

Quando terminei de ligar os pontos, vi as pirâmides do Vale de Gizé, no Cairo (Egito), vistas de cima e lembrei da maquete no primeiro andar com asobreposição da Constelação de Orion sobre elas.Outra pessoa descobriu fractais e um mistério logoabaixo do desenho, camuflado pela cor da parede,cada uma daquelas conexões tinha umaidentificação relacionada a algum lugar ou algo naÁfrica. E ao terminar de ligar os pontos, todosconheciam a “sua obra”, esfregando a mão bemrápido, produzindo calor e depois sumia de novo,assim como os riscos de caneta alguns minutosdepois.

Artista ……………………………..

Terceira fase afrofuturista (Brasil)

Arte sobre memoria – interativa

“´Periferia, baixada, quebrada, comunidade, tudo um lugarsó. Eu ia em eventos da área, via pessoas como eu fazendo algo para que víssemos além das barreiras

invisíveis, mas duras do mundo. E sobre esse invisívelresolvi fazer arte

e mostrar que somos parte no mundo”.

Ali estavam fractais da Colônia Baila na Zâmbia, os desenhos geométricos das casas dos povos Kassena de Burkina Faso, símbolos Adinkra e seu significado, desenhos contadores de história Lusona(Sona), arabescos egípcios, o relevo dos prédios da Universidade de Timbuktu (Mali) e … nem sei o que dizer, a não ser o que já tinha dito, arte e poesia comum toque muito legal de tecnologia.

Saímos lá de dentro com o sentimento de quem teveum sonho muito, muito bom e enfim, finalmente,estávamos no mesmo salão dos Três Clássicos 18 .

Aquele salão havia sido preparado de mododiferente, não vi nenhum painel, apenas paredesonduladas como dunas de areia e, cada uma,dedicada a eles, ela e suas obras que sussurravamsuas trajetórias dedicadas ao renascimentoconsciente de pessoas negras através de seusescritos e ações 19 .

As três primeiras obras literárias afrofuturistasbrasileiras do século XXI estavam ali, originais,autografadas e protegidas, cada uma no topo deuma pequena pirâmide transparente que lembravaaquelas do reino Kush no Sudão. E ali estava maisuma metáfora, eu pensei, a do conhecimento comoum tesouro que transcende o tempo.

Esperei a minha vez de chegar bem pertinho e veros detalhes, os livros 20 estavam fechados, mas aolado havia uma reprodução do autografado ededicatória que cada um fez, não só se referindo aolivro, mas inspirando quem o adquiriu a ser mais umponto luminoso na imensa obra que é a memória.

Lu Ain-Zaila

Duologia Brasil 2408

NKYINKYIM

Foi muito legal, cada parede dedicada começava com um arquivo de fotos organizado, de maneira circular, e no seu centro, encontrávamos suas mãos imortalizadas, que podíamos tocar, sentir cada linha e marca daquelas palmas e dedos que escrevera mas primeiras palavras sobre pessoas negras sendo extraordinárias no futuro, vozes sendo ouvidas e capazes de mover multidões ou salvar o mundo através de seus poderes, discursos, inteligência e sacrifício, um olhar e lugar humano a muito tempo merecido.

Fábio Kabral

O Caçador Cibernético da Rua 13

OWIA KOKROKO

Ao final daquele passeio por suas vidas, referênciase por tudo o que tinha visto até ali, lido,compreendido e sentido, entendi a essência do queé ser afrofuturista… uma face que vê e se orgulha detoda a sua ancestralidade ao olhar no espelho,ciente desde a primeira respiração ao acordar quemerece seu lugar ao sol, sob a luz da lua ou entre asestrelas no mundo real.

Anderson Assis

O Mensageiro das EstrelasAYA

E pensar assim, significa aceitar fazer uma jornadade autodescobrimento com reviravoltas, altos ebaixos que por fim, trazem como recompensa, orenascimento de si mesmo.

Ah… e o meu nome é o seu.

E esse foi o nosso rito de iniciação, compartilhadopor um encontro de caminhos em algum lugar dotempo e espaço.

Fui até aqui a voz da sua jornada por uma história dahumanidade que insistem em não contar, mas agoravocê é um afrofuturista como eu e vai contar erecontar até que a sua Era seja a minha Eratambém.

SIGNIFICADO DOS IDEOGRAMAS ADINKRA

Sankofa – Nunca é tarde para voltar e apanhar o queficou para atrás.

Nkyinkyim – iniciativa, dinamismo e versatilidade.

Owia kokroko – significa vitalidade e renovação.

Aya – significa resistência e perseverança diante dasadversidades.

OBRAS CITADAS

ERNESTO, Luciene (2016): Duologia Brasil 2408 (livro 1).(In)Verdades. Rio de Janeiro: sem editora.

ERNESTO, Luciene (2017): Duologia Brasil 2408 (livro 2).(R)Evolução. Rio de Janeiro: sem editora.

KABRAL, Fábio (2017): O Caçado Cibernético da Rua 13. Riode Janeiro: Ed. Malê.

ASSIS, Anderson (2016): O Mensageiro das Estrelas. Rio deJaneiro: Editorial Oeste.

REFERÊNCIAS

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SANCHÍS, Ima (2017): “He sufrido amenazas por ser mujer,negra, escritora y con éxito” – entrevista com N.K. Jemisin.Disponível em <http://www.lavanguardia.com/lacontra/20170726/4386826696/he-sufrido-amenazas-por-ser-mujer-negra-escritora-y-con-exito.html >.

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FREITAS, Kênia (Curadoria). Afrofuturismo: Cinema e Músicaem uma Diáspora Intergaláctica (2015). Disponível em <http://www.mostraafrofuturismo.com.br/Afrofuturismo_catalogo.pdf >.

LARGO, Vanessa; SILVA, Heloísa C. da. Matemática e Arte -Minicurso com base no livro de Paulus Gerdes. UTFPR.Disponível em <http://www2.td.utfpr.edu.br/semat/I_semat/MA.pdf >.

ACERVOS DIGITAIS

Imprensa Negra (Arquivo Público do Estado de São Paulo).Disponível em < http://www.arquivoestado.sp.gov.br/site/ >.

Imprensa Negra (Fundação Biblioteca Nacional). RJ.Disponível em < http://memoria.bn.br/hdb/periodico.aspx >.

___________. Imprensa Negra é destaque no site do ArquivoPúblico. Gov. do Estado de São Paulo. Disponível em <http://www.saopaulo.sp.gov.br/spnoticias/ultimas-noticias/imprensa-negra-e-destaque-no-site-do-arquivo-publico/ >.

USP (Portal da Imprensa Negra Paulista). Acervo digital(1903-1963). Disponível em <http://biton.uspnet.usp.br/imprensanegra/ >.

ESTADO DE SÃO PAULO. Comissão da Verdade: Relatório(Ditadura) – Tomo I – Parte II – Grupos sociais e movimentosperseguidos ou atingidos pela ditadura (Perseguição àpopulação e aos movimentos negros). 207 pg. Disponívelem <http://comissaodaverdade.al.sp.gov.br/relatorio/tomo-/downloads/I_Tomo_

Parte_2_Perseguicao-a-populacao-e-ao-movimento-negros.pdf >.

ESTADO DE SÃO PAULO. Comissão da Verdade: Relatório(Ditadura) – (TOMO I. Parte I: estruturas e sistemas darepressão; TOMO I. Parte II: Grupos sociais e movimentosperseguidos ou atingidos pela ditadura (negros, indígenas,feminino, LGBT, infância, trabalhadores, estudantes e saúdemental); TOMO I . Parte III: Ações de resistência e medidasde justiça de transição, e TOMO I . Parte IV: Arquivos ememória). Capítulos e subcapítulos. Disponível em <http://comissaodaverdade.al.sp.gov.br/relatorio/ >.

___________. PROJETO Resistir é preciso – A Imprensa daResistência. Disponível em <http://resistirepreciso.org.br/alternativa/ticao-jornegro-sinba/ >.

FAERMAN, Marcos (fundador). Jornal Versus (1975-1978):Suplemento Afro-Latino-América (a partir do número 12).Disponível em <http://marcosfaerman.s3-website-us-east-1.amazonaws.com/versus.html >

Rainha Ahmose Nefertari (múmia, mulher negra, detrancinhas). Imagem em <https://vinteculturaesociedade.wordpress.com/2014/01/28/imagem-a-rainha-e-suas-trancas/ >.

CONTOS

ERNESTO, Luciene (2017): Existência. Em: RevistaRaimundo (Ed. Nebulosa). Em: <http://www.revistaraimundo.com.br/9/la-z_p.php >.

ERNESTO, Luciene (2017): Contato. Em: <http://brasil2408.com.br/index.php/2018/01/19/conexao-conto/&gt;.

VÍDEOS

UNIVESP (Youtube). Fala, Doutor – Mário Augusto Medeirosda Silva: A descoberta do insólito (29 min).

UNIVESP (Youtube). Fala, Doutor: Ana Flávia MagalhãesPinto – Literatos negros, racismo e cidadania (29 min).

Saki Mafundikwa – TED (Palestra – legendada): Criatividadee elegância nos alfabetos africanos antigos (8 minutos).

Ron Eglash — TED (Palestra – legendada): sobre os FractaisAfricanos (17 minutos)..

Autora Nnedi Okorafor – TED (Palestra – legendada).: Sci-fistories that imagine a future Africa/ Histórias de ficçãocientífica que imaginam uma África futurista (9 minutos).

BBC: The Lost Libraries of Timbuktu/As últimas livrarias deTimmbuktu – Youtube – legendada (60 minutos).

______________ (vídeo). Sudão guarda pirâmides dadinastia de faraós negros dos reinos da Núbia. Disponívelem <http://g1.globo.com/fantastico/quadros/A-Jornada-da-Vida/noticia/2017/10/sudao-guarda-piramides-da-dinastia-de-faraos-negros-dos-reinos-da-nubia.html >.

FILMOGRAFIA*(apenas como referência de pesquisa)

SPACE IS THE PLACE. EUA. Duração: 83 minutos. Diretor:John Coney. Considerado marco do afrofuturismo no cinemaamericano.PUMZI. Quênia. Duração: 23 minutos. Diretora: Wanuri Kahiu.A NEGAÇÃO DO BRASIL. Brasil. Duração: 90 minutos.Diretor: Joel Zito.

1 – Tradução de um antigo livro sagrado indiano (trecho).Para saber mais, consulte a obra Racismo & Sociedade(Referências).

2 – Carlos Machado – Cientistas e inventores negros. (RevistaRaça, 2018), e 20 inventores negros de tecnologia.(Inspiração negra, blog, 2018)

3 – Sociedade de Intercâmbio Brasil-África, fundada em 1974.

4 – Movimento Unificado Contra a Discriminação Racial, edepois, Movimento Negro Unificado (MNU), nacional,fundada em 1978.

5 – Instituto de Pesquisa das Culturas Negras, fundado em1975.

6 – Centro de Cultura e Arte Negra

7 – Centro de Estudos Brasil-África, fundada em 1975.

8 – Visite o Museu Afro Brasil/SP -http://www.museuafrobrasil.org.br/

Versão digital -https://artsandculture.google.com/partner/museu-afro-brasil

9 – Muitos dos citados na primeira lista fazem, também, partedesta. E há outros e outras por aí…

10 – Publicação literária anual e nacional que reúne aprodução de vários autores e autoras negros.

11 – Jornal Versus (artigos e números onlines, ver seçãoAcervo Digital).

12 – Geração Mimeógrafo – não faz parte da concepção deliteratura marginal exposta aqui, que é real, fora dasociedade e distante do “aceite literário do cânone”.

13 – Quarto de Despejo – o diário de uma favelada (1960),Casa de Alvenaria, diário de uma ex-favelada (1961),Pedaços da Fome e Provérbios, e póstumos: Diário deBitita, Meu estranho diário (1996), Antologia pessoal (1996)e Onde Estaes Felicidade (2014). A maior parte de seusescritos inéditos se encontram na Biblioteca Nacional (RJ),Arquivo Público de Sacramento (MG) e também há escritosna Biblioteca do Congresso (EUA).

14 – O afrofuturismo afroamericano produz tanto músicas parao mercado quanto experimentais. E na internet você encontraSun Ra Arkestra, Janelle Monae, Ethiopia Ringaracka, LauraMvula, Ellen Oléria, Xênia França e outr x s.

15 – Consulte as referências para acessar mais informaçõessobre Afrofuturismo no Brasil.

16 – Obras afroamericanas em português: Quem teme amorte e Bruxa Akata (Nnedi Okorafor), Kindred – Laços desangue (Octavia Butler), e A Quinta Estação (N.K. Jemisin).

17 – Nome popular do cinema independente nigeriano(Nigéria, África).

18 – Obras de ficção científica e fantasia protagonizadas porpessoas negras em enredos onde a cultura e herançaafricana são o núcleo, ao mesmo tempo que refaz opensamento e demonstra que protagonismo é para pessoasnegras, tanto na ficção quanto na vida real.

19 – Debates, oficinas, visitas em colégios, eventos, artigos,contos, etc.

20 – Homenagem e lembrança. Espero que meus colegasautores gostem.

APOIADORESMuito obrigada a todas e todos por acreditar nestaobra e sua autora. 

***

Aline da Silva Costa

Ana Lúcia Merege

Ana Maria santeiro

Ana Paula de Souza

Ana Rusche

André Colabelli Manaia

Barbara Morais

Beatriz Santos – Mario M. Felix

Bruna Gnadt

Camila de Sousa Vieira

Camila Fernandes

Camila Pinho da Rocha

Camila Villalba

Carolina Rodrigues de Souza

Denise Frare Flaibam

Diego Furtado

Domenica Cristina Mendes

Eduarda Kali de los Santos

Eric Novello

Erika da Silva Santana

Fabio de Mello Rodrigues

Fábio Fernandes

Felipe Alves

Felipe Pereira

Felippe Lima Katan

Fernanda Nia

Flavia Bolaffi

Francis dos Santos

Gabriela da Costa Silva

Giovana Damaceno

Gleice Pinto

Gustavo Garcia Nogueira

Henrique Silva da Costa

Ione Mattos

Iris Figueiredo

Iracema Souza Morato

Janayna Bianchi Pin

Jayne Oliveira

João Paulo Simões

João Victor Burgos Fernandes

Joceline Gomes Silva

Jorge Dos Santos Valpaços

Jorge Pereira

Julian Vargas do Amaral

Juliana Aparecida de S. Guilherme

Juliana Berlim

Kamilla Baes

Karol Rodrigues

Katia Gilaberte

Larissa da Costa Barboza

Larissa Siriani

Leo Oliveira

Livia Maria R. Rosa

Maiara Alice Gomes de Oliveira

Marcial Marques

Maria Rosa Fontebasso

Maria Valéria Rezende

Marilia Aiko Kubota

Marilia Ramos

Marissel Maruca Hernández

Marta Barcellos

Michel Murta Peres

Paulo Galian

Paulo Vinicius F. dos Santos

Pétala Souza

Petê Rissatti

Priscilla Lhacer

Renata Oliveira do Prado

Risla Miranda

Rosana Rios

Sabrina Paixão

Santiago Santos

Silvana Márcia Schilive

Socorro Alencar Nunes

Susana Ventura

Valquíria Cordeiro

Vanessa Ratton

Waldson Gomes de Souza

Yuri Costa

Este é só o começo.

Não sei como, mas vez ou outra, voe, voe alto e semdestino.

Esse é o meu jeito de contar histórias.

Só pode ser eterno, o que vale a pena ser lembrado.

Faça magia com suas palavras.

Permita-se desafiar as possibilidades.

Não detenha seus sonhos, adie-os, mas não osperca de vista.

Arrisque um salto no desconhecido….

Meus passos, meu caminho, minha jornada.

Conteste, construa, comece…

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Afrofuturismo Brasil

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APOIADORES

Afrofuturismo – Galeria

Experimento Afrofuturista

Não sei como, mas vez ou outra, voe, voe alto e semdestino

Esse é o meu jeito de contar histórias

Só pode ser eterno, o que vale a pena ser lembrado

Faça magia com suas palavras

Permita-se desafiar as possibilidades

Não detenha seus sonhos, adie-os, mas não osperca de vista

Arrisque um salto no desconhecido…

Meus passos, meu caminho, minha jornada

Conteste, construa, comece…

Fonte: https://testing75.home.blog/2020/08/24/sankofia/amp/

A imagem foi retirada de https://revistacult.uol.com.br/home/afrofuturismo-tecnologia-ancestralidade/

Grada Kilomba e os seus “Episódios de Racismo Quotidiano”

Por Miguel Fernandes Duarte

O racismo parece estar finalmente a entrar no debate público e, sobretudo, a finalmente ser exposto. Quem desvaloriza a problemática insiste na existência do racismo enquanto comportamento isolado de pessoas isoladas, negando a existência de racismo estrutural e institucional. Negando, a quem dele sofre, o racismo quotidiano a que se é exposto diariamente. Mas os actores negros e afrodescendentes parecem estar, de uma vez por todas, a conquistar o seu espaço no espaço público nacional e a reclamar para si um espaço na história.

Exemplo da ausência desse espaço é o tempo que Memórias da PlantaçãoEpisódios de Racismo Quotidianolivro que fez nascer a artista portuguesa Grada Kilomba, demorou a ser publicado em Portugal. Com uma obra que se estende à performance, encenação, instalação e vídeo, foi no MAAT, em 2017, que Grada viu a sua obra ganhar espaço em solo nacional, depois de presenças em locais como a Bienal de São Paulo e a Bienal de Berlim. Originalmente de 2008, escrito em língua inglesa na Berlim onde ainda reside, só agora, onze anos depois, o livro é editado em português, numa edição espelhada da Orfeu Negro que nos mostra o nosso reflexo. Àqueles que são privilegiados, revela os preconceitos e o privilégio; àqueles que são constantemente desconsiderados pela dita normalidade da branquitude e permanecem escondidos pelo manto da invisibilidade, revela-os.

Uma compilação de episódios quotidianos de racismo, escritos sob a forma de pequenas histórias psicanalíticas, Memórias da Plantação percorre várias subtemáticas dentro do racismo. Das políticas de espaço e exclusão às políticas de corpo e do cabelo, passando pelos insultos raciais, o que temos é uma obra que combina teoria pós-colonial, estudos de branquitude, psicanálise, estudos de género e feminismo negro de modo a desmontar a normalidade do racismo, expondo a violência e o trauma de se ser colocada/o como «Outra/o».

A abordagem psicanalítica e a conceptualização do racismo quotidiano como traumática, enquanto experiência que marca a psique de quem o sofre, são, aliás, o que de mais interessante e inovador este livro nos traz.

No trauma clássico, o passado torna-se presente e o presente passado, e “é esta a função do racismo quotidiano: reencenar uma ordem colonial que se perdeu, mas que pode reviver-se quando o sujeito negro volta a ser posicionado como «o Outro».” O racismo quotidiano não deriva apenas de acções individuais isoladas num tempo e espaço, mas sim de uma cadeia acumulada de acções generalizadas, e de um acumular de episódios que reproduzem o trauma de uma história colonial colectiva. É a reencenação de um cenário colonial, daí, como explica a autora, “a metáfora da «plantação» como símbolo de um passado traumático reencenado por via do racismo quotidiano.” A ferida do passado constantemente reaberta no presente.

O livro, composto a partir de uma série de entrevistas a mulheres negras levadas a cabo pela autora, em Berlim, parte de uma concepção muito interessante de produção de subjectividade e não de conhecimento universal. O racismo é uma experiência apenas palpável por aqueles que são dele alvo, pelo que é essencial que se considere essa subjectividade da parte de quem sofre com ele. Abstrair “os relatos subjectivos das mulheres negras pode facilmente tornar-se forma de lhes silenciar a voz, para as objectificar em terminologias universais“.

Grada Kilomba

Sendo experiências sofridas na Alemanha, um país cuja trágica história recente está inscrita na memória comum de todos, é fácil, para nós portugueses, desvalorizar as experiências descritas no livro como sendo diferentes daquelas do nosso país. Qualquer pessoa que tenha o mínimo de contacto com o assunto sabe, no entanto, que episódios como os descritos neste livro são em tudo idênticos aos relatados por muitos por cá. Também por cá se identifica o sujeito negro como «a/o Outra/o», também por cá é “identificado como o objecto «mau», que personifica todos os aspectos que a sociedade branca reprimiu ou tornou tabu, ou seja, a agressividade e a sexualidade”, como representação de uma cultura primitiva, em necessidade de “civilização”.

Como diz uma das entrevistadas: “O racismo não é um insulto, é acima de tudo como as pessoas olham para ti…”. O sujeito branco vê no sujeito negro o que quer ver, justapõe aquilo que, de indesejável, pressupõe que lá esteja. Além disso, o racismo não é biológico, mas discursivo, funcionando através de uma cadeia de palavras e imagens que, por associação, se tornam equivalentes:

“as/os «Outras/os» nacionais são frequentemente definidas/os como […] imigrantes, e as/os imigrantes são frequentemente definidas/os como imigrantes ilegais. Se as/os imigrantes são ilegais, estão fora da lei; se estão fora da lei, são criminosas/os; se são criminosas/os, são perigosas/os; se são perigosas/os, tem-se medo delas/es; se se tem medo delas/es, tem-se direito a ser hostil ou até a eliminá-las/os.”

As palavras transportam poder e nem sempre nos é evidente como a sua escolha e o uso generalizado de determinadas expressões é opressivo para quem é por elas visado. Como Grada explica no prefácio que acompanha a tradução portuguesa, a língua portuguesa transporta em si várias relações de poder que, por exemplo, não são visíveis na língua inglesa na qual o livro foi originalmente escrito. A língua portuguesa está imbuída de uma imensa violência transportada pela normalidade masculina e branca, e Grada, como mulher negra, vê-se justamente desconsiderada nela, relegada para um lugar de subalternidade. Várias questões, então, foram levantadas no trabalho de tradução francamente complexo que Nuno Quintas levou a cabo com evidente habilidade. No entanto, a opção, visível no excerto acima, de apresentar várias palavras com ambos os géneros acaba por, muitas vezes, não resultar numa leitura fruível. Mesmo não sendo evidente que outra alternativa viável haja para contornar estas questões, a opção de o leitor ser consecutivamente confrontado com estes obstáculos à fluidez do texto não se afigura como sendo a melhor.

Ainda assim, esta é uma decisão gráfica e linguística que está longe de manchar a qualidade e a importância desta obra de Grada Kilomba. A sua chegada à língua portuguesa pode ser tardia, mas o problema que analisa está longíssimo de ser ultrapassado. Nos últimos tempos temos visto chegar traduções de várias vozes importantes neste combate, como Frantz Fanon, James Baldwin ou bell hooks, mostrando a abertura da sociedade ao tema e também o ganhar de consciência dos directamente visados por ele. Grada Kilomba é o elo seguinte dessa linhagem, e é com muito gosto que saudamos a sua presença entre nós.

Fonte: https://www.comunidadeculturaearte.com/grada-kilomba-e-os-seus-episodios-de-racismo-quotidiano/

Valter Roberto Silvério

Valter Roberto Silvério, professor do Departamento de Sociologia da Universidade Federal de São Carlos, diz que concluiu cedo em sua carreira que a perspectiva racial na academia era colocada em segundo plano. “O movimento negro nos permitiu ter uma visão desde cedo de que havia uma história subterrânea que não estava nos currículos”, diz ele, décadas depois.

Silvério estuda como movimentos negros em diversos países se articularam e se uniram desde o final do século 19 e faz parte de um grupo de pesquisadores que se dedica a contar a história da tradição intelectual negra internacional. “Não é um autor nem um texto nem um tema. É uma história inteira e ela não foi considerada”, diz ele. “O principal problema não é que as pessoas brancas não sejam sensíveis ao problema racial, (é que) elas não têm formação para entender isso de forma adequada. Por isso, uma reformulação curricular é urgente”.

Tendo estudado a história dos movimentos negros pelo mundo, Silvério acha que os protestos contra o racismo que irromperam em várias cidades nas últimas semanas são sem precedentes e podem inaugurar uma nova era. “Parece que uma parte da juventude branca entendeu que a sociedade gera privilégios para ela. E quando ela sai às ruas com os jovens negros se vê outra configuração de luta”, avalia.

No Brasil, os protestos contra o racismo se deram em meio a manifestações contra o governo do presidente Jair Bolsonaro. Ao mesmo tempo, surgem propostas formação de uma frente ampla de pessoas de diferentes visões ideológicas, uma nova versão do movimento Diretas Já, de 1984, contra a ditadura militar.

Silvério dá boas-vindas a isso, mas faz ressalvas: “as bases disso não podem ser com os pressupostos de 1984 — homens brancos que estão sempre na mídia, que são sempre os mesmos, chamando para a criação da frente. É desconhecer que há movimentos novos importantes, com lideranças novas, e que a questão, por exemplo, da bandeira do antirracismo, que eu prefiro chamar de antirracialização, é uma bandeira importante e é um elemento de mediação na construção de qualquer frente democrática”, diz ele.

Desde a redemocratização, opina, a questão racial não teve o avanço necessário, inclusive nos governos mais alinhados à esquerda e ao movimento negro.

Veja os principais trechos da entrevista para a BBC News Brasil.

BBC News Brasil – O senhor estuda intelectuais negros e transnacionalismo. Podem explicar o que é sua pesquisa?

Valter Silvério – Tive três estágios importantes no exterior e passei um período nos arquivos da Unesco em Paris levantando documentação para a minha tese, que não é só minha. Sou vice-presidente do comitê científico para os volumes 9, 10 e 11 da coleção História Geral da África (projeto editorial da Unesco). Nos últimos 15 anos tenho pesquisado esse tema. Nas minhas viagens para países africanos, Europa, Estados Unidos, China, consegui coletar um material razoável que estou somando a pesquisas que fiz em outros momentos. Estou tentando articular esse volume desde 2018 e estou escrevendo um livro sobre isso. Espero concluir e lançá-lo neste ano.

É uma tentativa de reconstruir e construir novas referências de como a história da sociologia e política lidaram com a questão racial. Há autores e autoras e marcos importantes — formação da Liga das Nações, os congressos panafricanos, a formação da ONU, a definição da Unesco de criar histórias setoriais ou continentais, a participação do Abdias do Nascimento (intelectual e referência do movimento negro brasileiro) no primeiro festival de cultura negra.

São marcos construídos por agência política criativa de intelectuais negros e negras e eles escreveram muito sobre esses marcos, registraram de forma acadêmica esses eventos, então tem muita literatura, ainda muito desconhecida no Brasil mas já conhecida nos EUA e Inglaterra.

Eles ganharam novos leitores a partir de estudos pós-coloniais. Há um resgate desses escritos que me parece que vai formar uma base importante para uma crítica aos clássicos da sociologia, história, ciência política. Achei que isso demoraria algumas décadas, mas me parece que os jovens estão mais insatisfeitos do que eu em termos do que recebem como conteúdo em suas formações.

Claro que há uma juventude que não está interessada nesses conteúdos, mas acho que (para) um acadêmico da área de ciências humanas é assustador desconhecer essa tradição de pensamento que tem muita coisa escrita. Não é um autor nem um texto nem um tema. É uma história inteira e ela não foi considerada.

BBC News Brasil – Como o senhor viu os atos antirracismo que aconteceram no Brasil nos últimos fins de semana?

Silvério – Vejo de forma emocional. Fico emocionado de ver que a juventude entende que o mundo não pode continuar dessa maneira. Quando saem à rua em meio à pandemia estão dizendo que é melhor morrer do que continuar nessa situação.

Parece que uma parte da juventude branca entendeu que a sociedade gera privilégios para ela. E quando ela sai às ruas com os jovens negros se vê outra configuração de luta. Essa configuração de luta se dá na chave de valores. No Brasil, temos o mito da democracia racial, e preto se confunde com pobre. Sempre há um acadêmico que faz uma análise e econômica e não racial. Não se quer enfrentar quais são as bases da pobreza no Brasil, que são a questão racial e o racismo. Não é que esses jovens não vejam que existe um problema econômico, mas estão exigindo mudanças de valores. Essa chave contra a racialização, contra políticas públicas racializadas, contra uma percepção midiática racializada abre um horizonte novo de perspectivas no que pode vir a ser o mundo pós-pandemia.

Hoje todos são antirracistas — a imprensa, políticos, a universidade —, mas as práticas cotidianas dessas profissões são atravessadas pela racialização. No Brasil, não vi as redes chamando por exemplo a professora Petronilha Gonçalves (professora emérita da Universidade Federal de São Carlos que estuda relações étnico-raciais) para discutir o que está acontecendo. Chamam pessoas que estão falando sobre um momento. A mídia faz isso porque desconhece essa história, essas pessoas. O buraco é mais embaixo, e está muito bem cavado. Há uma mudança importante na forma de agência política, ela deixa de ser nacional e se transforma em transnacional, mas as questões nacionais vão aparecer, especialmente em relação ao protagonismo. Mas me parece que é uma nova configuração mundial em termos de luta.

O que acho que vai ocorrer imediatamente é que os partidários da classe social vão criar discurso de que é um problema do capitalismo e não de valores sociais. Me parece que jovens estão colocando, diferentemente de outros momentos, que querem valores que reconheçam que o fato de você ser diferente do ponto de vista de cor, raça e sexualidade não significa que não deve receber tratamento igual. A agenda que vem a seguir vai tentar atravessar essa mobilização com o movimento da desigualdade econômica. Mas me parece que a juventude está compreendendo que o que está na base dos problemas são questões de valores e não econômicas.

Menina negra com cartaz
A bandeira do antirracismo esteve fortemente presente nos atos pela democracia; aqui, uma jovem no ato em Brasília

BBC News Brasil – Os protestos que estamos vendo em diversos países têm um paralelo histórico? Nos EUA temos visto algumas comparações com o movimento por direitos civis nos anos 1960.

Silvério – Acho que não. (Nos EUA, nos anos 1960) os jovens universitários negros tinham que tentar convencer os colegas de classe brancos de que a questão racial era importante. Essa consciência que vemos hoje do jovem branco que sai para a rua numa pauta antirracialização não existia.

Outra diferença era o escopo. Havia polos: Paris, Nova York, Boston. Agora, você vê movimentos em todas as capitais do mundo. Isso é novo e ganha dimensão transnacional de fato. Ou seja, são pessoas que pensam para além da nação. O problema não é interno, ele atravessa a experiência do jovem, em especial o negro, mas não só ele. E a maneira como algumas manifestações estão se comportando também me parece nova.

A estátua do traficante de escravos Edward Colston (1636-1721) foi parar dentro do rio. Os símbolos de um sistema que se estruturou a partir da opressão estão em questionamento. Não admitem formas de opressão que venham a ser negociadas a posteriori. Gerações anteriores sabiam da importância disso, mas flexibilizaram. Não sei até que ponto essa flexibilização será forçada. Até algum ponto será.

BBC News Brasil – O senhor vê mudanças concretas no horizonte?

Silvério – Vejo sim. Do ponto de vista macro, existem iniciativas muito interessantes. Não são movimentos de rompimento, mas que minam as bases racializadas que temos, inclusive bases de conhecimento, e não só a repressiva. Há uma preocupação de mudar bases repressivas, isso é importante, mas não é tudo.

No Brasil, tenho certeza de que vai acontecer avanço. Eu acompanho algumas redes. Na dos mais jovens, universitários, negros, frutos de ações afirmativas, vejo muita movimentação. São vários e se movimentam de diferentes maneiras. São os primeiros doutores de suas famílias, mas não perderam ligação com suas origens. Para mim, por exemplo, foi diferente. Eu nasci na periferia de São Paulo e a mobilidade individual, especialmente educacional, me levou a perder vínculos com pessoas da minha geração.

Mas as formas repressivas no Brasil são mais violentas. O Brasil não é para principiantes, ele é muito complexo e os ânimos estão quase no limite. Não vejo, diferentemente de muita gente, uma possibilidade golpe, mas não vejo qualquer transição simples no âmbito de perspectiva mais progressista, a não ser que surjam novas lideranças que consigam equacionar a pluralidade de demandas. O Brasil pode vir a ser o país onde essa crise se aprofunde mais em relação às várias agendas de emancipação — feminista, econômica, de raça, pobreza, desigualdade de renda, plano sanitário. Capturar agenda e fazer ela se tornar algo que ela não é, isso é a especialidade do Brasil.

BBC News Brasil – O que acha da ideia de uma frente ampla democrática e como a questão racial deve entrar nisso?

Silvério – Em sã consciência, ninguém é contra isso, não pode ser contrário a uma frente contra o que está acontecendo hoje no Brasil. Mas as bases disso não podem ser com os pressupostos de 1984 (movimento Diretas Já): homens brancos que estão sempre na mídia, que são sempre os mesmos, chamando para a criação da frente. É desconhecer que há movimentos novos importantes, com lideranças novas, e que a questão, por exemplo, da bandeira do antirracismo, que eu prefiro chamar de antirracialização, é uma bandeira importante e é um elemento de mediação na construção de qualquer frente democrática. Diria que o mesmo vale para questões de gênero e LGBT.

Uma frente não se faz em abstrato, mas a partir de questões concretas. Uma questão que existe no Brasil e que nunca foi compreendida pela esquerda, pelo menos não de forma adequada, é a questão racial. Ela foi acionada nos momentos de democratização do país, mas sempre foi secundarizada no momento em que passam as eleições. A juventude tem uma informação das gerações passadas das armadilhas colocadas nesses discursos.

BBC News Brasil – O senhor diz que a questão racial nunca foi compreendida pela esquerda, pelo menos não de forma adequada. Por quê?

Silvério – O que vimos a partir de 1988 no Brasil foi que, embora essas agendas (identitárias) fossem importantes, no dia seguinte ao impeachment da presidente Dilma Rousseff, negros, gays, feministas foram acusados de que o problema era deles, dessa agenda culturalista. Isso foi dito por alguns desses senhores e acadêmicos que propõem a tal frente democrática. Temos que ver isso porque quando forem eleitos, esquecem quem os elegeu. Esse processo está colocando um conjunto de novas possibilidades, mas temos que tomar cuidado com como ele se constrói, do ponto de vista prático, e não a partir do discurso de ‘depois vocês vão ter acesso aos direitos’, como ocorreu em 1988.

Temos que aguardar qual será a capacidade desses grupos se organizarem no nível prático político. Para pessoas como eu, que acompanham esses grupos, orientam alunos oriundos desses grupos, isso não é novo e amadureceu dessa forma, e está surpreendendo muitas pessoas, muitos analistas que estavam confortavelmente pensando que construir uma frente contra o atual presidente seria uma questão macro — ‘olha, vamos construir uma frente, separamos os temas mais complicados e depois a gente vê’.

Os novos atores parecem querer discutir melhor o agora, e não o futuro. Isso deve trazer dificuldade para a construção dessa frente.

Derrubada de estátua de britânico por ativistas antirracistas
Derrubada de estátua de britânico por ativistas antirracistas gerou onda de questionamento de homenagens a personagens históricos envolvidos em massacres

BBC News Brasil – O senhor vê mudanças nesse sentido na geração atual de lideranças?

Silvério – Acho muito difícil mudar agora. Os quadros políticos que temos não têm formação para compreender isso. (Tem uma lógica de) incorporar parte das demandas e estabelecer controle para que elas operem num tempo mais longo do que poderia se operar.

Por exemplo, o Brasil hoje talvez tenha legislação mais avançada para incorporar conteúdos de história afro-brasileira e africana. O campo normativo está pronto. Por que não foi implementado? Porque não coloca dinheiro para fazer formação de professores, gestores — e isso foi feito enquanto a esquerda estava no poder. Não dá pra dizer que não foram incorporadas, mas ela não resultou em linhas orçamentárias para que fossem implementadas. A esquerda entende a importância, mas tem um pressuposto de que é um problema de classe e não de valores. O que está acontecendo agora é que talvez fique claro que os valores estão articulados à dimensão econômica, algo que intelectuais negros vêm dizendo há 150 anos.

BBC News Brasil – Como essa incompreensão, como o senhor diz, da esquerda em relação à questão racial aconteceu em outros países?

Silvério – Todos os partidos comunistas importantes se posicionaram na melhor das hipóteses de maneira ambígua com relação à emancipação colonial. O partido francês rachou. Os trabalhistas na Inglaterra estruturaram um regime que era totalmente a favor da manutenção das colônias na região do Caribe. A formação da esquerda é uma formação não-crítica à dominação colonial em que está implícita o operador raça e a ideia que existe hierarquia entre humanos.

Hoje, segue não fazendo a crítica. Todos os intelectuais negros racharam com os partidos comunistas em função da incompreensão de que tinham da questão racial. Depois de 1968 ampliaram seu acesso à formação formal e passaram a construir um conhecimento que reconta a história da África e dos afro-americanos, afro-brasileiros. O principal problema não é que as pessoas brancas não sejam sensíveis ao problema racial, elas não têm formação para entender isso de forma adequada. Por isso, uma reformulação curricular é urgente. Os americanos avançaram mais do que os brasileiros. É racismo acadêmico.

O Brasil é um país onde não há constrangimentos morais por parte dos acadêmicos e da intelectualidade. Esse processo está em curso no Brasil, ele é complexo porque temos o mito da democracia racial. Dois exemplos ilustrativos: a presença em um única dia de dez pessoas negras na Globonews em momentos diferentes num dia só. Que avanço. Mas aconteceu num dia por conta de uma viralização em que um jovem branco comentou que o tema era racismo e só tinha comentaristas brancos. Agora fazem transição achando que colocando comentaristas negros está tudo resolvido. Você pode colocar cara preta e não mudar a agenda do debate na mídia. O Brasil é isso. Não há constrangimento moral.

BBC News Brasil – O senhor diz que se formou no movimento negro. Como foi sua trajetória?

Silvério – Vi e participei de vários eventos que começaram como denúncia da violência policial no Brasil, por exemplo, e havia toda uma orientação sobre como se comportar diante da polícia. Mais tarde entendi que não era um problema só do Brasil, mas de todas as capitais imperiais e nos EUA. Em todos os lugares em que houve trabalho escravo isso é uma realidade. O movimento negro nos permitiu ter uma visão desde cedo de que havia uma história subterrânea que não estava nos currículos.

Gosto muito de pensar numa passagem da (socióloga) Patricia Hill Collins sobre (os movimentos estudantis de) 1968 em que ela deixa evidente que a agenda que os brancos defendiam era diferente da que os negros defendiam. Em Paris, enquanto os jovens brancos reivindicavam rupturas em questões de comportamento, negros reivindicavam que a França saísse de seus espaços territoriais. Ao mesmo tempo em que havia uma reivindicação de mudança e de valores — orientação sexual, autonomia das mulheres —, havia uma bandeira paralela extremamente importante que estava relacionada a quase 70% da humanidade, que era a descolonização e o fim do imperialismo e que colocava populações da África e Ásia em situação subalterna.

O que vemos hoje são reivindicações que vêm desde o início do século 20. Ganharam nova relevância nos anos 1960 com a luta pelos direitos civis, junto com reivindicações feministas. Qual agenda andou? A de direitos civis, especialmente para as mulheres brancas, e não para as negras, e as de ações afirmativas, que passa a ser a realidade das principais universidades norte-americanas. Esse momento de mudança passa a formar um número maior de jovens negros que são os intelectuais que vão questionar essa trajetória histórica colonizada eurocêntrica que faz parte da nossa formação até os dias de hoje. O que está em crise não é só uma reivindicação de mudança da polícia diante dessa morte (Floyd). Ela é o ápice do que populações inteiras suportaram.

Tenho formação técnica — fiz anos de engenharia química. Com os contatos com o movimento negro, me tornei uma pessoa organizada, tive formação trotskista relativamente disciplinada e depois rompi porque entendia que a agenda da esquerda não considerava a contento minhas questões particulares em relação às questões gerais.

BBC News Brasil – Como o movimento negro hoje é diferente daquele em que o senhor participou em sua juventude?

Silvério – É uma geração muito mais preparada. Éramos dois ou três. Agora são centenas. (…) Me parece que essa geração que está indo às ruas agora está muito mais preparada do que a minha — de formação intelectual e preparação psicológica e quantitativamente. Falo de jovens que estão na universidade, na comunidade. E há iniciativas como a Uniperiferia, Observatório de Favelas, que são locais em que se articulam práticas sociais combativas com conhecimento teórico histórico sobre a população negra.

Abdias do Nascimento
Grupo de teatro criado por Abdias do Nascimento alfabetizava ex-escravos

BBC News Brasil – No passado, como o movimento negro no Brasil se relacionou com movimentos negros em outros países?

Silvério – Era mais complexo, dependia dos correios e de pessoas que dominassem outro idioma. Alguns jornais americanos que registravam conflitos raciais foram lidos por membros de associações de jornais negros no Brasil, mas a circulação era muito restrita. Além disso, pessoas que tinham formação acadêmica eram praticamente obrigadas a se compor se quisessem sobreviver. Não havia espaço de crítica.

Havia também uma percepção de segmentos da população negra de que África era um mal, no Brasil e nos EUA. Há todo um debate na década de 1920 nos EUA através do movimento New Negro e no Brasil, por meio do movimento antropofágico. O New Negro era um movimento que ressaltava a existência de uma cultura negra diferente da branca. O movimento antropofágico dizia que isto aqui é uma grande mistura.

Na década de 1930, quando você pega a Frente Negra Brasileira, ela não era simpática às reminiscências africanas. A antropologia brasileiras se forma sobre esse caldo de cultura, de que a cultura africana é ‘inferior’ e foi sincretizada. Então havia todo um esforço de desvalorização da cultura africana que foi incorporado por parte da população negra. Isso vai até a década de 1950. No momento em que tem o projeto de JK de reconstrução desenvolvimentista do Brasil é que começa uma mudança.

Uma pessoa como Abdias, que publicou o jornal Quilombo, foi para o Rio de Janeiro, participou da criação do Teatro Experimental do Negro, foi candidato a deputado pelo PTB, publica esse jornal e até o final dos anos 1950, acredita na democracia racial, mas rompe com essa perspectiva no final dos anos 1950. Logo depois, vai para um festival de artistas e escritores negros, fez a denúncia do genocídio da população negra, se exila por um tempo, e quando volta ao Brasil, em 1983, volta com um livro já escrito, O Brasil na Mira do Pan-Africanismo, que fala sobre o genocídio, e em 1983 lança um movimento chamado quilombismo.

Então, na década de 1960 tem uma mudança da percepção de ativistas e intelectuais negros em relação à importância da África para pensar o conhecimento. Intelectuais brancos insistiam que o atraso no Brasil estava ligado à presença de africanos e parte dos negros incorporaram essa tese e só mudam a chave a partir da década de 1960 no bojo desses movimentos de direitos civis (EUA), emancipação do continente africano etc. O Abdias inscreve o Brasil nessa nova lógica de luta social cujos desdobramentos a gente está vendo agora.

Fonte https://www.bbc.com/portuguese/brasil-53031445

O fotógrafo Maurício Hora (esquerda) e o ilustrador André Diniz.

O fotógrafo Maurício Hora (esquerda) e o ilustrador André Diniz. Foto: Luciana Quaresma

“Morro da Favela” é um dos trabalhos mais expressivos do argumentista e ilustrador carioca André Diniz. O romance gráfico conta a história de Maurício Hora, o fotógrafo que nasceu e cresceu no Morro da Providência, no Rio de Janeiro. A comunidade, que começou a se formar em 1897, é considerada a primeira favela do Brasil.

Por:Luciana Quaresma

Para André Diniz, contar a vida do fotógrafo Maurício Hora em quadrinhos foi e tem sido uma grande experiência:

“Foi um desafio novo. Em um primeiro momento fiquei até travado, justamente pela responsabilidade que era colocar expressões e palavras de pessoas que viveram e que vivem no local, é algo delicado principalmente por serem histórias de vida complicadas. Foi um desafio enorme. Eu nunca tinha feito nada parecido e até passei a usar software para escrever o roteiro, organizar as cenas, pois a minha ideia era mesmo contar uma história com começo, meio e fim.”

Diniz fez questão de fugir da ficção e ser fiel à biografia de Hora como ponto de partida para a obra:

“Desde o começo, eu não queria ir nesta corrente da ficção que busca a favela como um pretexto para mostrar cenas de violência, de tiroteio, para fazer um ‘western’ brasileiro. Eu queria justamente ir contra isso. Comecei a ficar interessado pela figura humana do Maurício, pela história de vida, pelo trabalho dele com a fotografia, transformando a favela em arte.”

As fotografias de Hora também ilustram as páginas do quadrinho e algumas delas estão na exposição. Um olhar orgânico de um morador do Morro que, através da fotografia, buscou a sua identidade e mostrou ao mundo a realidade da favela.

Fotografia de Maurício Hora na exposição "Morro da Favela", em cartaz em Lisboa.
Fotografia de Maurício Hora na exposição “Morro da Favela”, em cartaz em Lisboa. Foto: Luciana Qauresma/RFI/Maurício Hora

Hora explica que esta foi a ferramenta que encontrou para conseguir ser ouvido:

“A minha fotografia não tem muito a ver com a história do livro. Ela fala sobre a favela, ela mostra a favela mas ela é uma ferramenta de transformação. Tem a ver com o livro porque sou eu, claro, mas ela é uma fotografia de alguém que precisava gritar, só isso! Ela quer revelar, ela quer transformar. A minha fotografia não é tão agressiva, mas é muito real. A ideia é não chocar muito, não ser tão dramática, mas mostrar a realidade. Também tem coisas muito bonitas, como a paisagem da favela. Antes, ninguém via essa paisagem”.

A exposição promovida pela Embaixada do Brasil em Lisboa faz parte do programa Brasil em Quadrinhos, realizado em parceria com a Bienal de Quadrinhos de Curitiba.

Luciana Falcon, que realizou o projeto, teve como inspiração o cenário da história trazendo um pouco da favela carioca para Lisboa:

“Adaptar uma obra como a do André Diniz junto com as fotografias do Maurício Hora, que expõem juntos pela primeira vez e nessa casa espectacular, é um puro deleite. A gente tentou adaptar e reproduzir – dentro das possibilidades de cronograma e financeiras – um pouco dos elementos que remetem à obra: desde a cor, que tem a ver com a que foi escolhida para a capa do quadrinho, até elementos da favela, como o tijolo, o andaime, e reproduzir em tamanho muito ampliado os detalhes do André Diniz.”

Segundo o ilustrador, é muito gratificante poder levar a Portugal a realidade difícil da favela e a poesia do brasileiro, no contexto de uma troca cultural que é cada vez mais forte.

Marco no quadrinho brasileiro

Para Igor Trabuco, do Setor Cultural da Embaixada do Brasil em Lisboa, esta exposição ainda é mais especial pelo fato de ser inédita:

“Nunca foi feita uma exposição das fotos com os quadrinhos. A junção das duas linguagens, que neste projeto se fundem em uma única narrativa, cria uma curiosidade extra. O olhar de delicadeza do André soube traduzir em desenhos uma realidade complexa, que comporta muitas camadas sociais, gerando uma reflexão. Ele conseguiu trazer isso com um traço de leveza. É, sem dúvida, uma obra-prima, um marco no quadrinho brasileiro como um todo.”

Para Carlos Alberto Simas Magalhães, embaixador do Brasil em Lisboa, a produção de quadrinhos no Brasil vive um momento de grande dinamismo e a obra emblemática de Diniz traz um novo olhar:

”A exposição convida o visitante para uma reflexão acerca da temática urbana, desenvolvida com grande sensibilidade numa e noutra forma de expressão, mas principalmente sobre a intertextualidade que orientou a concepção do projeto”, destaca o embaixador.

A nova edição de “Morro da Favela” tem doze páginas a mais do que a versão anterior e, segundo a dupla, continua em transformação.

“As páginas vão sendo adicionadas por coisas novas que aconteceram na minha vida e da própria cidade do Rio, como a Fundação da Casa Amarela, por exemplo, a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos, que mudaram a cara da cidade e principalmente na área do Morro”, explica Hora.

“É um processo que está em constante transformação e isso se reflete no livro. Vou acrescentando aquilo que considero que enriquece essa narrativa, do ponto de vista de conteúdo e relevância para o leitor, mas sempre tentando traduzir os acontecimentos da vida do Maurício”, destaca Diniz.

A exposição fica na Casa Pau-Brasil, no bairro Príncipe Real, em Lisboa, até 31 de março próximo. A entrada é livre.

http://www.rfi.fr/br/europa/20200216-%E2%80%9Cmorro-da-favela%E2%80%9D-o-romance-gr%C3%A1fico-de-andr%C3%A9-diniz-ganha-exposi%C3%A7%C3%A3o-em-lisboa

Assol Garcia nasceu a 19 de Abril de 1989 na cidade de São Filipe, no Fogo. Desde pequena gostava de ouvir rádio e na “escola, nos intervalos das aulas, reunia todas as amigas para que a ouvissem cantar”.

 Aos 21 anos, cantou pela primeira vez para um público “mais sério”, num evento organizado num restaurante local onde outros artistas iam atuar ao vivo.

Nessa ocasião, surgiu o convite para que a jovem passasse a integrar uma banda local. Sem hesitar, Assol aceitou e passou a fazer parte dos “Naja”, um grupo constituído por 4 elementos. Tornaram-se, rapidamente, conhecidos do público da ilha e passaram a ter lugar cativo em quase todos os eventos musicais no Fogo.

Passado alguns meses, Assol partiu para a cidade da Praia onde conheceu Manel di Candinho com o qual chegou a atuar em vários palcos nacionais e não só.

Vera Duarte e Dina Salústio são seguramente as duas autoras cabo-verdianas com maior projecção internacional. As suas obras têm sido distinguidas em diversas ocasiões e são estudadas em várias universidades estrangeiras. Antes da partida para o Brasil onde vão participar de 12 a 25 de Agosto em diversas actividades literárias, o Expresso das Ilhas conversou com as escritoras sobre vários tópicos ligados à literatura cabo-verdiana, desde a sua almejada internacionalização até à complexidade e os desafios da escrita no feminino.

Vão estar no Brasil para participarem em diversas actividades literárias. Podiam avançar alguns detalhes?

Dina Salústio (DS) – Vou fazer a abertura da Bienal de São Luís do Maranhão, no dia 29. Estou a fazer o caminho inverso da Vera [Duarte]. Trata-se de um seminário sobre “Literatura e Línguas, em tempo de resistência”. Vou aproveitar para lançar lá a sexta edição do meu livro “Mornas eram as Noites”. Vou ter a oportunidade de me encontrar com um investigador brasileiro que estudou as minhas obras e que me projecta dentro do Brasil, mas também projecta-me para Cabo Verde. Eu penso que nós os cabo-verdianos precisamos do olhar de um estrangeiro, porque quando um leitor cabo-verdiano vê a opinião de um crítico estrangeiro, quase que ele se sente compelido para uma releitura da obra. Depois vou estar em Forteleza, em Redenção e vou estar também em Sergipe para participar na Conferência Internacional “Literatura Entre Irmãos” e estarei em várias universidades brasileiras para falar de alguns temas dos meus livros como a loucura, a solidão, o mar e assim por diante.

Vera Duarte (VD) – É também um pouco na linha do que disse a Dina [Salústio]. Nós vamos começar no dia 14 com uma conferência internacional na Academia Gloriense de Letras. Há uns tempos atrás tivemos a oportunidade de fazer o lançamento de um livro que se chama “Literatura entre Irmãos” que traz participação de autores cabo-verdianos e brasileiros. É uma obra interessante que pretende contribuir para esse processo de aproximar literariamente Cabo Verde e Brasil. Vamos então falar das convergências entre a literatura dos dois países. Depois temos o encontro “Literatura & Mulheres”, em Sergipe, onde estará presente a Conceição Evaristo, uma escritora negra brasileira que está num momento extraordinário da sua carreira. Vamos falar um pouco da escrita de autoria feminina que é um tema que está actualmente muito em voga, pois cada vez mais se fala do lugar de fala das mulheres e através da escrita a gente está a fazer isso. Depois temos a XIII Bienal Internacional do Livro do Ceará, que acontece de 16 a 25 de agosto de 2019, com a temática “As Cidades e os Livros”, onde a gente estará em Fortaleza fazendo palestras, encontros e conversas com estudantes universitários e não só. Estaremos também em Redenção para alguns encontros na UNILAB uma universidade que acolhe vários estudantes dos PALOP. Obviamente que vou ter também a oportunidade de divulgação e venda dos meus livros no Brasil.

Há cerca de dois anos que se vem falando da internacionalização da literatura e dos autores cabo-verdianos. O ministro da Cultura prometeu apoio à tradução dos nossos autores, mas o que se vê é que os grandes impulsos têm vindo ainda de fora. Qual a vossa opinião?

DS – Eu acho que já demos um grande passo em termos de mundialização da nossa literatura com os festivais que se fazem agora no país: Festival do Sal, Festival da Morabeza, Encontro de Escritores de Língua Portuguesa, etc. Quer dizer, são festivais que vêm a Cabo Verde, mas ajudam os escritores cabo-verdianos a serem mais conhecidos. Depois eles também nos convidam. Por exemplo, eu já fui convidada para ir à China pelo Festival Literário Morabeza [Morabeza – Festa do Livro promovido pelo Ministério da Cultura]. As despesas, diga-se, foram pagas pelo ministério da Cultura. O que é difícil para nós é o acesso a outros espaços literários, porque através do português estamos quase que confinados ao Brasil, a Portugal e aos outros países onde se fala português. Então estamos no bom caminho. Depois a atribuição do Prémio Camões a dois autores cabo-verdianos dá-nos também uma certa visibilidade. É pouca coisa? Para nós é sempre pouco, mas vê-se que se está a fazer qualquer coisa. Eu gosto de ser positiva.

VD – Devo dizer que realmente estive sempre nessa luta pela internacionalização da literatura cabo-verdiana. Isso vem para o bem do país, amplia as fronteiras do país, amplia as possibilidades do país. Dá-nos também a possibilidade de sermos lidos por um número cada vez maior de pessoas. É algo que nos interpela e que a gente gosta. Devo dizer que tenho tido a sorte de me convidarem de fora. Nunca participei em eventos internacionais através do ministério da Cultura, mas tenho tido a sorte de me convidarem de fora. Já estive várias vezes no Brasil, vou a Portugal, vou à França, ou a outros países que nos convidam e levamos connosco a nossa escrita e a escrita de outros autores cabo-verdianos. Mesmo quando me convidam para ir falar dos meus livros, a gente vai falar é da literatura cabo-verdiana e de Cabo Verde. De facto, como diz a Dina [Salústio], com esses festivais literários, tem havido um esforço para maior conhecimento dos nossos autores. É que nós passamos de um período em que não tínhamos nada e nestes últimos três anos tivemos os festivais Literatura-Mundo, o Festival Morabeza e os Encontro(s) de Escritores de Língua Portuguesa. Isso é muito bom, mas há necessidade de haver mais políticas incentivadoras, porque parece que é o que fazem os outros países para se conseguir a tal internacionalização de que muito falamos. Por exemplo, eu no Brasil estou no currículo escolar do terceiro ciclo. O Manual de Língua e Cultura põe Vera Duarte como representante da literatura contemporânea cabo-verdiana. Acho que não tenho esse mesmo tratamento aqui. Eu estou muito de acordo com a Dina quando ela diz que os grandes impulsos vêm de fora. As pessoas lá fora convidam-nos, as pessoas querem ouvir-nos e fazem por isso. Por isso o impulso vem realmente de fora.

A internacionalização faz-se sobretudo com a tradução de autores. Apesar da promessa do ministério da Cultura em apoiar a tradução de autores cabo-verdianos, a tradução das vossas obras não foi feita com dinheiro do governo.

DS – Eu ganhei um prémio nas Canárias, fui traduzida para o espanhol, depois ganhei um prémio na Inglaterra e fui traduzida para o inglês; na França é um leitor anónimo que está a fazer a minha tradução; na Itália fui traduzida por uma estudiosa da minha obra. Quer dizer, são coisas pontuais e individuais. De facto, há um projecto do ministério da Cultura e o sr. ministro falou nisso. É que só com a tradução é que se faz o arranque para outros mercados. Não vale a pena dizer que somos lidos na Inglaterra, se a gente não tem livros traduzidos. É o que nos falta. Seria um apoio muito grande que houvesse essa política de tradução.

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Certamente não estarão a exigir uma Atlantic Music Expo para a literatura?

VD – Não, a primeira coisa que eu gostaria de dizer é que quando nós reclamamos um espaço e um apoio para a literatura não estamos a exigir que se retire dos outros para nos dar. Eu acho que a literatura é algo que ajuda cada ser humano a abrir os seus horizontes, a ser mais culto, a ser mais livre… Quer dizer, eu acho que vale a pena investir na literatura. Quando a gente vê os montantes que são investidos na música e faz uma pequena comparação com a literatura… pelo amor de Deus. Não vale a pena dizer que não há nenhum termo de comparação entre as duas coisas.

DS – Se calhar precisamos de um Djô da Silva para investir em nós para a gente poder publicar por esse mundo fora. Eu penso que nesta linha de escritor até ao editor falta o promotor: aquele que leva o livro para as outras ilhas. O meu livro [Romance Veromar] que foi lançado na Praia no mês de Maio, não está em São Vicente. Pode ser que não se venda nenhum livro, ou que se venda só dois, mas não deixa de ser uma atenção para os leitores das outras ilhas. Ou seja, tinha que haver uma cadeia de distribuição. Mas não há, você vai ao Fogo, vai a Santo Antão e não encontra o livro…

VD –A distribuição é qualquer coisa que falta e que afecta a nós próprios de uma forma negativa. Nós lançamos aqui na Praia pura e simplesmente porque estamos aqui, mas ficamos logo com esse problema de consciência: estamos a lançar aqui na Praia, mas não lançamos no Sal, não lançamos em São Vicente, não lançamos em Santo Antão. Era necessário que houvesse algum mecanismo público que fizesse chegar os livros a todas as ilhas. Eu vejo que há países que traduzem os seus autores e colocam lá fora. Portanto, era necessário que se pudesse contar com esse incentivo que um livro publicado aqui na Praia pudesse chegar a todas as outras ilhas. Aqui tudo fica nas mãos do autor: o autor escreve, o autor vai buscar financiamento…

É claro que há actualmente em Cabo Verde duas editoras privadas, a Livraria Pedro Cardoso e a Rosa de Porcelana Editora que mudaram de certa forma o paradigma editorial em Cabo Verde.

VD – Estão a fazer um bom trabalho. Mudaram o panorama editorial no país.

DS – Lembro-me que quando começamos a escrever, havia uma única editora aqui que era o Instituto Cabo-verdiano do Livro. Agora já temos várias editoras, mas a edição em Cabo Verde continua a ser muito cara. Às vezes quando vejo o preço dos meus livros até sinto vergonha. Como as pessoas em Cabo Verde não ganham muito, se queremos que o livro seja um produto acessível há que se diminuir os custos.

Mas para os festivais de música não falta dinheiro.

DS – É isso. Nós não somos assim tão amigos da leitura como se dizia. De um modo geral as pessoas não têm o hábito de ler.

O que é ser escritor num país em que se lê pouco?

VD – Bom, a gente escreve primeiramente por um impulso interior. Tenho de dizer claramente que eu escrevo para ser lida, gosto de ser lida. Não escrevo para pôr na estante. Eu acho que mesmo que não tivesse um único leitor, continuaria a escrever, embora o meu motor seja o feedback das pessoas, ou quando a gente recebe um prémio. É sempre um estímulo, mas na verdade eu escrevo pelo gosto da escrita. Obviamente que eu gostaria de contar com três mil leitores, três milhões de leitores. Esse é que seria uma grande alegria.

Conforta de alguma forma pensar que se não forem lidas hoje sê-lo-ão pelas futuras gerações?

DS – Hoje, nós somos mais imediatistas. Nós estamos vivos e queremos ser lidos enquanto estamos vivos. Depois de morrer pode ser até que ninguém nos leia e o sonho fica por aí. Na verdade, a gente quando escreve quer que as pessoas nos leiam, porque nós também temos mensagens. Nós também queremos falar no nosso país, da nossa vida, das mudanças que se operam na sociedade e na natureza. Quando escrevemos falamos de tudo isso e queremos que essas mensagens passem, mas não passam porque os que deviam ser nossos leitores não nos leem. É como aquela coisa nas escolas: lês, mas nem sabes quem estás a ler.

VD – Mas a escrita tem os seus prazeres. Quando vamos a um encontro, a gente dialoga, volta e meia tu recebes no Facebook, no teu email, no WhatsApp mensagens incentivadoras. De­vo dizer que isso conta muito, porque para nós quem nos lê e nos aprecia é a melhor coisa que nos pode acontecer. E um quinhão de felicidade do escritor está nesses feedbacks. Sem dúvida.

Outra forma de felicidade deve ser a adaptação de um dos vossos livros ao cinema.

DS – Eu quando escrevo estou a preparar um filme. Também quando falo estou a encenar-me porque sou muito teatral. Falo alto, grito, gesticulo. Quando escrevo eu quero que as pessoas vejam o que estou a escrever. Não estou a escrever o guião para um filme, mas estou a dar dicas de como seria o filme. Eu gostaria de ser filmada.

VD – Eu também. Na verdade, eu escrevo para comunicar. Como disse a Dina há pouco, escrevo para transmitir as minha ideias e no fundo a gente quer disseminar as coisas que consideramos positivas. E nada como a imagem. Quer dizer, um filme a dizer o nosso livro é qualquer coisa como quando a gente escreve poemas. Um poema declamado é bonito, mas um poema musicado tem essa possibilidade de chegar a muito mais gente. Eu também sou um bocadinho pictórica quando eu escrevo.

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“Quando aparecemos ninguém nos lia”

Nesta segunda e última parte da entrevista as escritoras Dina Salústio e Vera Duarte continuam a sua reflexão sobre a escrita no feminino e debruçam-se sobre as suas mais significativas produções literárias.

Qual dos vossos livros gostariam de ver adaptado ao cinema?

Dina Salústio (DS) – Acho que a Louca de Serrano dava bem, porque as partes do romance que estão sequenciadas compunham um filme. Não pensei nele como um filme, mas enquanto escrevia estava a ver as pessoas…

Vera Duarte (VD) – No meu caso seria A Matriarca, que é uma história de mestiçagens. Eu vejo pictoricamente cada capítulo do livro e acho que daria muito bem. O Júlio Silva, que é um realizador Moçambicano, disse que quer fazer um filme de A Matriarca. Bom, vamos ver. Gostaria de ver.

Quem seria o realizar. Francisco Manso ou Leão Lopes?

DS – O Francisco Manso já tem muito trabalho e não vale a pena dar-lhe mais trabalho. Nem mesmo o Leão Lopes. Somos muito amigos, eu ia tratá-lo muito bem, mas eu gostaria de ter um realizador americano…

VD – Claro, Hollywood é a Meca do entretenimento, também eu gostaria.

O tema da nossa entrevista era a Literatura no Feminino, mas acabei por desviar-me um pouco. Aliás, há boa e má literatura e todo o resto é circunstancial, como prova a autora da série Harry Potter com cerca de 500 milhões de livros vendidos em todo o mundo.

DS – Bom, aquela mulher levanta-se de manhã, escreve uma frase e já ganhou milhões. É uma senhora superdotada, de uma imaginação sem limites. Mas há uma coisa: ela tem uma máquina por detrás dela e dos grandes escritores. Uma máquina que a suporta, que publicita os seus livros e que a obriga a escrever. Eu, ninguém me obriga a escrever…

VD – Essa pressão das editoras tem o seu lado positivo. Quando nos pedem uma coisa isso obriga-nos a escrever. Por exemplo, o conto que mandei para o livro de Oeiras. Pediram-me, sentei-me e escrevi um conto. Estimula.

Acham que há uma literatura no feminino e no masculino, ou boa e má literatura?

DS –Em boa medida, não devia haver literatura no feminino e literatura no masculino. Devia haver tout court literatura, mas nós fomos de tal maneira acantonadas no esquecimento que quando aparecemos ninguém nos lia. Então, tivemos que nos apropriarmos desse termo que já andava pelo mundo que é a literatura no feminino, porque, de facto, a literatura no feminino é uma literatura diferente. É uma literatura em que tem a voz da mulher, que trata assuntos da mulher, que tem as dores da mulher. Por exemplo, eu não sei nada do que pensam as mulheres cabo-verdianas sobre a fome, porque quem falou da fome foi Manuel Lopes, Jorge Barbosa, Luís Romano… Só homens, homens, homens, homens é que nos falaram. Mas não há nenhuma voz feminina a falar da fome. Há dias ouvi uma investigadora cabo-verdiana a dizer que as mulheres foram muito bem tratadas pelos escritores cabo-verdianos. Mas não é isso, não estou a falar da imagem, estou a falar da voz. Cada um de nós tem sua voz…

VD – Eu acho que a escrita de mulheres é uma escrita de resistência mesmo. É uma escrita de resistência ao silenciamento que nos foi feito, é uma escrita de resistência ao esquecimento, é uma escrita de resistência ao machismo…

Tem-se-lhe apontado que os seus primeiros livros de poesia tinham uma forte carga erótica.

VD – Eu já ouvi isso. É que nós vínhamos de uma época em que as mulheres não tinham voz. Aqui dentro fomos nós que começamos a experimentar muitos caminhos novos que antes não tinham sido trilhado por mulheres. Por exemplo, o professor Alberto Carvalho diz que eu fui a primeira pessoa a escrever prosa poética em Cabo Verde. Quando eu escrevi os “Exercícios Poéticos”, não sabia disso. Nós estávamos a trilhar caminhos novos. Li Madame Bovary, a mulher ama e o homem ama e a mulher morre. Em Tolstói a mulher ama e o homem ama e a mulher morre. Em Machado de Assis, a mulher ama e o homem ama e a mulher morre. Então, a gente queria de alguma forma dizer ‘nós queremos amar e queremos viver’. E por falar de libertação, acho que teremos que ir a essa escrita que muitas pessoas chamam de literatura com algum erotismo. É que estamos a falar de libertação, eu acho que é por essa via.

Se não me engano, a escrita no feminino, apesar de dar voz às mulheres, não mexe com o status quo.

DS – Eu na minha escrita, desde que comecei a escrever para a rádio, por volta de 1982, já os temas que eu abordava, eram temas tabus. O que são temas tabus? São temas que incomodam: não se podia falar da violência doméstica; não se podia falar do ciúme que provoca a morte; do ciúme estúpido, do ciúme aberrante que depois acaba na morte da mulher e que havia e há ainda em Cabo Verde; não se podia falar da violência sobre a criança. Então comecei com esses temas que ao fim e ao cabo quebravam um pouco a visão da sociedade de então. É claro que quando comecei a escrever já se falava sobre estas questões, mas havia coisas que a gente queria mostrar. Eu tinha esse veículo que era a rádio e a escrita e aproveitei.

Os vossos livros têm sido distinguidos em várias ocasiões, Prémio Sonangol para “A Candidata” (2004) de Vera Duarte e Prémio PEN de Tradução (2018) para a obra “A Louca do Serrano” de Dina Salústio. Afora o Prémio Camões que ainda não foi atribuído a nenhuma autora cabo-verdiana, a escrita no feminino, em termo de distinções, não está aquém da escrita no masculino. Qual é a vossa opinião?

VD – Acho que sim, mas a verdade é que nós queremos mais. Nós queremos que esse olhar não fique parado apenas na Vera Duarte ou na Dina Salústio, mas que seja um olhar que cubra as mulheres que escrevem. Depois da nossa geração já estamos a ter uma outra geração de mulheres que escreve de uma forma muito interessante. Se já conseguiu contabilizar cerca de 84 mulheres cabo-verdianas que de alguma forma já publicaram algum dia, o nosso objectivo é que cada vez mais o edifício literário cabo-verdiano comporte nome de homens e de mulheres.

É claro que promovendo a torto e a direito corre-se o risco de promover a mediocridade. Qual é o limite da promoção da escrita no feminino?

DS – Mas também temos que concordar que não há incentivos para a escrita feita por mulheres. Quer dizer, nós temos conquistado um espaço por mérito próprio, fruto de muito trabalho. Com livros publicados, com conferências, com palestras, com entrevistas e estamos a fazer o nosso caminho na sociedade. Então, quando escrevemos e temos algum reconhecimento é porque a sociedade se revê na nossa escrita. Mas que eu saiba, não tem havido concursos para a escrita feminina, não tem havido prémios para a escrita feminina e que eu saiba não tem havido incentivos nenhuns. Tem havido sim alguns poucos estímulos à literatura no geral. E por sorte, e porque também nós escrevemos com alguma competência, somos reconhecidas.

Acham que é razoável haver uma escrita essencialmente feminina?

DS – Não, não faz sentido dizermos que temos uma escrita essencialmente feminina, separada da escrita feita por homens. Acho que estamos em pé de igualdade com os homens. É isso que tem de se ver. Quer dizer, quando se compra um livro da Dina não é porque a Dina é mulher, mas porque gostam do livro.

VD – Eu acho o seguinte: quando falamos da escrita de mulheres é mais uma preocupação de dar visibi­lidade. É por isso é que se fala do lugar da fala. Quer dizer, já não queremos que uma mulher escreva algumas coisas sobre este ou aquele assunto e depois não se veja que aquilo foi uma escrita de uma mulher para podermos chegar àquele momento em que já não haverá efectivamente escrita de mulheres e escrita de homens. Haverá só escrita tout court.

Alguma vez pensaram em usar um pseudónimo masculino?

DS – Jamais, e se eu tivesse pensado a vergonha seria tanta que não diria.

VD – Eu nunca pensei. Eu, por exemplo, nunca quis assinar V. Duarte como assino em outras coisas, só para que se pudesse ver que aquilo era uma mulher a escrever. Na literatura eu quero que fique claro que aquilo é uma mulher. Acho que aquilo foi um tempo em que as mulheres tiveram que utilizar esse subterfúgio, mas agora só faz quem quiser.

Apenas pela temática pode-se descobrir a nacionalidade de um(a) autor(a) cabo-verdiano(a)?

DS – Eu acho que sim. Penso que quando se pega num livro meu vê-se claramente que sou uma autora cabo-verdiana. Falo das montanhas e dos vales de Santo Antão, da Baía do Porto Grande, em São Vicente, falo do interior de Santiago. Quer dizer, tudo isso tem uma força tão grande enquanto cenário que as pessoas dizem ‘esta escritora é cabo-verdiana’. Também a nossa construção de fala é diferente da do Brasil, de Portugal, de Angola, etc.

VD – O que não quer dizer que os sentimentos que o livro trata não sejam a condição da mulher e que os sentimentos não sejam sentimentos universais – a morte, o amor, a vida; enfim, acho que está tudo lá.

A primeira incursão da Vera Duarte na ficção com o romance “A Candidata” foi logo galardoada com o Prémio Sonangol. Que comentário?

VD – Foi extraordinário. Talvez por isso estou agora cada vez mais na ficção. Na verdade já tenho alguns livros de poesia publicados, mas cada vez mais estou a escrever ficção. “A Matriarca” é ficção, “Cabo Verde: Um Roteiro Sentimental, viajando pelas Ilhas da Sodad, do Sol e da Morabeza” é ficção, estou a escrever um romance e três contos, ficção, estou com um livro de ensaios, prosa. Acho que esses géneros completam-se.

A tradução inglesa de “A Louca de Serrano” conquistou o Prémio Pen Reino Unido de Tradução em 2018. Que perspectivas se lhe abrem esta distinção?

DS – Foi um prémio que me deu muito gozo, porque eram 83 países a concorrer e por isso fiquei muito feliz por a tradução do meu livro [The Madwoman of Serrano] ter conquistado o prémio. Este prémio vai permitir-me entrar no mercado inglês. Por exemplo, há dias uma revista inglesa telefonou-me para enviar um conto para ser publicado. Para o mês que vem vou para o Quénia, mercado inglês, por causa desse prémio que eu recebi na Inglaterra. Os mercados abrem-se graças aos prémios, porque os prémios fazem-nos conhecidos, porque somos publicados, porque as revistas estão atentas e os editores estão também atentos. Para o meu livro que saiu há dias [Veromar] já há um inglês que quer traduzir e telefonou-me a perguntar como é que ele poderia traduzir “Veromar” em inglês. A mesma coisa com o prémio que ganhei na Espanha [Prémio Rosalía de Castro do Centro Pen Galícia] dá-me uma nova possibilidade de ser lida em Portugal, porque o prémio já foi ganho por alguns bons escritores portugueses. Então as pessoas dizem, ‘olha, uma cabo-verdiana ganhou esse prémio que já alguns dos nossos grandes ganharam’ então os editores portugueses começaram a se interessar por mim, convidando-me para conferências, para as universidades… quer dizer tudo isso conforta e aconchega.

Qual dos vossos livros gostariam que perdurasse na memória dos leitores?

DS –Eu gostaria de ser lembrada por “Mornas eram as Noites”, que é um livro que é dado nas escolas. Os jovens com agora 30 anos lembram-se de terem lido aquele livro na escola. Gostava de ser lembrada por este livro.

VD – Acho que é pela“Amanhã amadrugada” por ser a primeira obra que publiquei. Eu queria publicar este livro para ter voz de mulher. Foi um livro querido, quando apareceu. Evidentemente que anteriormente eu escrevi poemas que publiquei no jornal “Voz di Povo” e na revista “Raízes”, mas chegou o momento em que alguma coisa dentro de mim disse-me ‘oh menina, só homens, vai’. Então peguei nos poemas, enviei para uma editora e eles publicaram.

https://expressodasilhas.cv/cultura/2019/08/25/quando-aparecemos-ninguem-nos-lia/65377

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Cartaz do Flink

Mostra em São Paulo celebra literatura negra

O Festival FlinkSampa, que celebra a literatura negra, termina neste sábado (19) na capital paulista. Desde sexta-feira (18), a mostra recebe convidados brasileiros e estrangeiros em uma programação que inclui palestras, mesas de discussão, lançamentos de livros e exibições de filmes. As atividades ocorrem no campus da Universidade Zumbi dos Palmares (na zona norte), no Memorial da América Latina (zona oeste) e nos campi da Uninove.

“A gente sempre ouvia falar que a Flip [Festa de Literária Internacional de Paraty] nunca tem escritores negros. Este ano que passou foi outra polêmica que não tinha escritores negros”, comenta a pró-reitora da Faculdade Zumbi dos Palmares, Francisca Rodrigues, sobre a origem do festival, que neste ano chega à quarta edição. “A gente resolveu mostrar que temos escritores renomados e não renomados muito bons. Uma Flip só de negros ou com temas negros”, acrescentou.

Nomes internacionais

Entre os autores estrangeiros presentes ao evento está o escritor angolano Alberto de Oliveira Pinto, participante de uma mesa sobre Agostinho Neto, um dos principais nomes da luta pela independência de Angola. Além de ativista político nas décadas de 1960 e 1907, foi poeta e o primeiro presidente do país.

A presença de importantes nomes de fora do país, mostra, na avaliação de Francisca, a importância que o evento ganhou desde 2013, quando foi criado. “A gente começou com autores nacionais e depois estamos com autores internacionais renomados e importais da Academia Brasileira de Letras”, destacou.

O evento homenageia o advogado, jornalista e escritor Luiz Gama, um importante intelectual abolicionista, que passou parte da vida escravizado. “O advogado dos oprimidos”, na definição apropriada por Francisca para justificar a escolha do personagem a ser lembrado na festa, foi tema de pesquisa de alunos do Sesi e da Fundação Bradesco. Os jovens foram convidados a fazer um vídeo de um minuto relacionando justiça e liberdade à figura de Luiz Gama.

Entre as produções audiovisuais exibidas na mostra, várias tratam de temas relacionadas ao empoderamento feminino, também um dos eixos da prohttp://www.vermelho.org.br/noticia/289926-1gramação. Na programação também está a exibição da websérie documental Empoderadas e do curta-metragem ficcional A Boneca e o Silêncio, dirigido por Carol Rodrigues, que trata da temática do aborto.

A programação completa está disponível na página do evento.

Fonte: Agência Brasil

http://www.vermelho.org.br/noticia/289926-1

Quarta-feira, 21 de setembro, a dançarina Nora Chipaumire e o sociólogo e cineasta Tukufu Zuberi debaterão a respeito das novas perspectivas sobre arte Africana e as percepções tradicionais da produção cultural negra. O debate será moderado por Monique Scott (Bryn Mawr College).

Resultado de imagem para Tukufu Zuberi

Para mais informações:

http://www.philamuseum.org/calendar?id=21&et=7&dt=September_2016&utm_medium=social%20media&utm_source=tumblr&utm_campaign=programs&utm_content=NoraChipaumire_convo#18787