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          “Para mim, arquitetura significa processo, experimentação e trabalho em equipe.”
   
—Francis Kéré

O arquiteto africano Diébédo Francis Kéré, vencedor de diversos prêmios internacionais, é conhecido por sua abordagem multicultural da arquitetura. Embora seu escritório, Kéré Architecture, esteja instalado em Berlim, muitos de seus projetos são desenvolvidos em seu país natal, Burkina Faso, na África Ocidental, onde é conhecido por incorporar materiais vernaculares e mão de obra local em seus projetos.

“Estou trabalhando entre dois continentes, ou duas culturas. E estou, de algum modo, fazendo a ponte”, nos disse Francis Kéré na abertura da Bienal de Veneza deste ano. Dentre os projetos desenvolvidos por seu escritório estão a Biblioteca Escolar em Gando, o Centro para a Arquitetura da Terra e o Parque Nacional de Mali.

Nessa entrevista, Kéré explica sua abordagem em relação à arquitetura – que assume posturas diferentes em Berlim e em Burkina Faso – e comenta o que significa “absorver a modernidade” em seu país.

Veja a entrevista em vídeo no link abaixo:

http://www.archdaily.com.br/br/626119/ad-brasil-entrevista-diebedo-francis-kere-kere-architecture

Sobre o arquiteto e sua obra veja mais em: 

http://www.kere-architecture.com/

ANDRÉ REBOUÇAS - INVENTOR - (60 anos) * Cachoeira, BA (13/01/1838 ...

Maria Alice Rezende de CARVALHO. O quinto século, André Rebouças e a construção do Brasil. Rio de Janeiro, Revan/Iuperj, 1998. 254 páginas.

Wilma Peres Costa

No ano de 1891, o engenheiro e intelectual liberal André Rebouças desenhou em seu Registro de Correspondência um triângulo equilátero, nomeando cada um dos lados: Joaquim Nabuco (Liberal), Taunay (Conservador) e André Rebouças (sem partido). Por meio de uma tênue linha pontilhada, os ângulos da figura uniam-se em uma pirâmide, em cujo vértice encontrava-se o nome de d. Pedro II. Assim ilustrava Rebouças suas relações com seus companheiros de campanha abolicionista e militância reformadora, reunidos pelo exílio europeu: divergentes em suas escolhas partidárias, mas unidos em sua lealdade a d. Pedro II.

A ilustração é fecunda em sugestões e serve como ponto de partida para o instigante estudo de Maria Alice Rezende de Carvalho que, centrado na trajetória de André Rebouças, nos convida a refletir sobre o pensamento brasileiro nas últimas décadas do século XIX.

São múltiplas as razões que fazem oportuna a reflexão sobre a trajetória desse pensador e o seu legado, não sendo a menos importante a atual entressafra de intelectuais com espírito público, em vívido contraste com o final do século XIX, tão profícuo no esforço de “pensar” e “reformar” o Brasil, quanto trágico no destino reservado a muitos dos “intelectuais militantes” de vários matizes: a loucura (Aristides Lobo), o crime passional (Euclides da Cunha), o suicídio (Silva Jardim (?), Raul Pompéia e o próprio Rebouças). Ao escolher como caminho para estruturar a biografia intelectual e política de Rebouças a referência a Joaquim Nabuco e Alfredo Taunay, o livro de Maria Alice Rezende de Carvalho aborda uma faceta das agitadas correntes de idéias que animaram o Brasil naquele período — os liberais reformadores que se mantiveram fiéis à monarquia e que viram nessa instituição uma espécie de caminho insubstituível para as “reformas liberais”. A República, na concepção desse grupo e de outros intelectuais monárquicos, nada mais era do que o resultado do conluio dos escravocratas descontentes com a Abolição com o militarismo de inspiração platina. Elanos afastava da Europa e da Civilização e nos lançava na vala comum do caudilhismo latino-americano.

A influência dessa visão foi profunda na historiografia brasileira e aparece reciclada em muitas interpretações vigentes. André Rebouças é o menos lido da tríade e, de certa forma, o menos influente nas correntes do pensamento brasileiro subseqüentes. A obra literária de Taunay, em particular os clássicos A retirada da Laguna e Inocência, é das mais lidas e comentadas da literatura brasileira, ao passo que O abolicionismo e Um estadista do Império, representando diferentes momentos da trajetória política de Joaquim Nabuco, desfrutam a curiosa peculiaridade de serem obras fundantes, respectivamente, da historiografia crítica e da historiografia conservadora no Brasil. A maior parte da obra de Rebouças permanece não publicada, estando confiada aos seus Diários íntimos e à sua extensa correspondência, ou foi divulgada em revistas dedicadas a temas técnicos de engenharia e agricultura, hoje de difícil acesso. O esforço em legitimar seus argumentos na linguagem da ciência e da técnica não ajuda, também, sua aproximação com o leitor de hoje. Tudo isso torna ainda muito mais meritória a cuidadosa garimpagem de uma parcela significativa de seu pensamento realizada pela autora e sua habilidade em reconstruí-la numa “trajetória” com sentido. O resultado faz ressaltar, por um lado, a profunda imersão de Rebouças na problemática de seu tempo e, por outro, a impressionante atualidade de seu pensamento. Seu cerne— o obstáculo representado pelo monopólio da terra à construção de um capitalismo dinâmico e de uma democracia genuína — ainda desafia pensadores e militantes nesse triste final de século XX.

Para desenhar a primeira vertente interpretativa, Maria Alice Rezende de Carvalhoconduz o leitor, através de refinada erudição, para as leituras que esse intelectual “periférico” e seus companheiros faziam da efervescência intelectual que acompanhava as Grandes Transformações nos centros do pensamento europeu e norte-americano. O leitor ganha, assim, uma rica reconstituição das principais linhas do pensamento europeu do século XIX (e mesmo anterior, no caso das leituras privilegiadas pela autora para o entendimento da formação de Rebouças), forjando as saborosas tipologias do “inglês” (Nabuco), do “francês” (Taunay) e do yankee (Rebouças).

Em uma segunda vertente interpretativa, a autora privilegia a escolha e a trajetória profissionais de Rebouças, com um panorama do ensino e do exercício da Engenharia, nas suas vertentes militar e civil, como uma maneira estratégica de encarar a formação de Rebouças e sua inserção social. O leitor atento pode apreciar, aqui, uma tensão, embora não seja essa a ênfase preferencial da autora, entre duas linhas de força na vida de nossa personagem. De um lado, a opção pela Escola Militar e pela carreira “científica” indica direção alternativa ao bacharelismo típico da elite imperial, o que aproximaria a história pessoal de Rebouças da de vários membros da contra-elite crítica, cientificista, antibacharelesca que se forja na Escola Militar a partir da Guerra do Paraguai (e da qual Benjamim Constant e seus discípulos são uma espécie de paradigma). De outro, os profundos laços de Rebouças com o Imperador e sua família e com alguns proeminentes estadistas do período, como o Visconde de Itaboraí, para não falar de seu convívio referencial com os melhores filhos-família da Corte da Belle Époque. Isso não obstante uma profunda aversão à política partidária, que acompanha nosso engenheiro durante toda a vida, e uma busca quase quixotesca do “espírito empresarial” e da “livre iniciativa”, que marca sua vida pública durante a década de 1870.

Parece quase impossível pensar essa tensão sem tematizar a questão racial e a posição excêntrica de Rebouças como refinado intelectual negro em uma sociedade escravista. Nossa autora escolheu não fazê-lo, embora a questão não esteja ausente de seu trabalho. Acompanha nisso, solidariamente, sua personagem, extremamente reticente em abordar a problemática da cor no plano de sua experiência existencial, embora inflamado abolicionista. Desperta-nos, entretanto, a curiosidade em saber como, nos imaginados debates da Sociedade de Imigração da qual faziam parte Rebouças e Taunay, nosso engenheiro encarava a questão do “branqueamento”, tão notória nas propostas daquela entidade. Da mesma forma, nos textos trabalhados por Maria Alice Rezende de Carvalho, podemos adivinhar divergências entre Rebouças, Taunay e Nabuco no calor da campanha abolicionista e no tratamento da questão agrária e do problema social nos anos subseqüentes. Ou, em outra direção, ficamos a nos perguntar o que teria impedido esse apaixonado cultor da livre empresa de aproximar-se das iniciativas que, poucas, mas expressivas, desenvolviam-se na Província de São Paulo, como a expansão ferroviária com capital nacional?

A verdade é que, dentre os muitos méritos desse fascinante trabalho, conta-se o de transmitir ao leitor de hoje o interesse pelas profundas ambigüidades de sua personagem: um homem de formação militar que tenta até o limite a carreira de self made man; um intelectual negro apaixonado pela cultura yankee; um filho-família que rejeita a carreira política; uma biografia de positivista que floresce como expoente liberal; um cultor do livre-cambismo e admirador das duas mais importantes vias de desenvolvimento atravésdo protecionismo no século XIX (os EUA e a Alemanha); um dandy, apaixonado pela ópera, que vive como celibatário e termina trágica e solitariamente seus dias no fundo de um penhasco na Ilha da Madeira.

O Brasil pelo qual ele lutou é uma quimera, como afirmou nossa autora encerrando seu trabalho: “Afinal, no século que se seguiu ao seu suicídio, atirando-se de um penhasco em Funchal, os três amigos permaneceriam amalgamados na trajetória empreendida pelo Brasil: o rinnovamento de Nabuco tornar-se-ia o método pelo qual os brasileiros reconheceriam o seu longo e lento movimento em direção às reformas; o império de Taunay, metáfora de sua aspiração por uma `razão de Estado’ ilustrada e complacente, seria reeditado em muitas versões ao longo do século XX, das quais a emergência de um novo Estado — o Estado Novo — seria a sua mais acabada expressão; por fim, a democracia expansiva de Rebouças, refletindo sua crença na potencialidade libertária dos interesses, seria a forma assumida pela esperança, no crepúsculo desse nosso quinto século”. Muitos de nós não acalentamos essa esperança — a de que a livre iniciativa e as forças liberadoras do mercado sejam capazes de construir e consolidar a democracia nesse sombrio final de século XX. Sentimo-nos convidados, entretanto, por esse belo livro, a nos aproximarmos do pensamento e do legado de André Rebouças, no seu profundo inconformismo com a desigualdade e no seu incansável combate às oligarquias, à miséria e à exclusão social.

WILMA PERES COSTA
é professora do Departamento de Política e História Econômica do Instituto de Economia da Unicamp e coordenadora associada do Centro de Estudos Brasileiros do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da mesma universidade.

Fonte: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-69091999000200014&lng=en&nrm=iso

Por Nirton Venâncio*

No Estácio, bairro da zona central do município do Rio de Janeiro, nos anos 40 circulavam o bonde, os automóveis… Era sempre um dia de paz nos largos que contornavam os sobrados.

Nos séculos 18 e 19, o grande logradouro no centro do bairro fixava-se como um dos eixos entre os núcleos primitivos dos sertões e a cidade que se modernizava, entre os engenhos dos Jesuítas e os charcos e pântanos juntos aos morros. Com o avanço do tempo que ficou mais firme, tornou-se uma espécie de porta de entrada da zona norte e subúrbios, curando e secando a bronquite com algumas folhas de hortelã de quem passeava na praça.

Ali, em janeiro de 1951, exatamente no morro do Estácio, nasceu o menino Luiz Carlos dos Santos, filho de dona Eurídice e ‘seu’ Oswaldo, sambista de primeira. O garoto cresceu na favela do morro de São Carlos, berço do samba, a mais antiga do bairro e da cidade, por conta da primeira agremiação carnavalesca, a Deixa Falar, criada pelos moradores em 1928.

“Fui pegando a viola dele, tirando uns acordes, observando. Ele não deixava eu pegar a viola de 4 cordas que era uma relíquia, muito bonita, onde eu aprendi a tocar umas coisas“, disse em entrevista muito tempo depois Luiz, que se tornou Melodia, sobre o pai Oswaldo, quem o inspirou na música.

O poeta Wally Salomão, com suas calças vermelhas e casaco de general, cheio de anéis, assíduo frequentador do morro, num holiday descendo todas as ruas descobriu o cantor. Se alguém quisesse encontrar Melodia, que o encontrasse no Estácio, bem junto ao paço onde passavam os bondes, e bem junto ao passo do passista da escola de samba.

Wally, sem cansaço e acreditando em Melodia, agora sua imensa obsessão, pegou um vapor barato imaginário e o apresentou à honey, honey baby Gal Costa no show que ele dirigia, “Fatal”, no Teatro Tereza Raquel.

Do amor da morena baiana domingo no espaço, como prova de amor mostrou um novo canto e resultou a gravação de “Pérola negra”, no disco “Gal a todo vapor”, 1972.

O resto é história do negro gato de arrepiar, com sua voz de ébano que veio nos felicitar com atitude na música brasileira. O novo peregrino sábio do centro da cidade nos assemelhando.

Luiz Melodia partiu na madrugada de 4 de agosto daquele 2017 que levou também Belchior, Jerry Adriani, Kid Vinil, Loalwa Braz (do grupo Kaoma), Almir Guineto, Karl Hummel (do Camisa de Vênus), Butch Trucks (do Allman Brothers Band), Al Jarreau, Toby Smith (do Jamiroquai), George Young e Malcolm Young (do AC/DC), Kerry Turman (do The Temptations), Chuck Mosley (do Faith No More) Gira (do Nação Zumbi), Fats Domino, Chuck Berry, Chris Cornell…

Agora, nem queiram saber em que ano estamos.

*https://vermelho.org.br/prosa-poesia-arte/rasque-a-camisa-enxugue-o-meu-pranto/

Aos 81 anos, atriz Chica Xavier agradece mensagens de fãs. Veja vídeo

Chica Xavier, nome artístico de Francisca Xavier Queiroz de Jesus, foi uma produtora teatral e atriz de teatro, cinema e televisão brasileira.

Nascimento: 22 de janeiro de 1936, Salvador, Bahia

Falecimento: 8 de agosto de 2020, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro

CônjugeClementino Kelé (desde 1956)

FilhosClementino de Jesus JúniorIzabela de JesusChristina de Jesus

LivrosChica Xavier canta sua prosa: cantigas, louvações e rezas para os orixás

Veja mais em: https://www.terra.com.br/diversao/tv/blog-sala-de-tv/majestosa-chica-xavier-foi-a-grande-dama-negra-das-novelas,71a41e6b14867264ed6ba886481eb68f4y9pkbyk.html

“Hoje, os Estados Unidos choram a perda de um dos maiores heróis de sua história”, declarou a presidente da Câmara, Nancy Pelosi, em nota.

Veja mais em https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/afp/2020/07/18/morre-john-lewis-emblematico-ativista-dos-direitos-civis-nos-eua.htm

Por Naiara Paula

INTRODUÇÃO*

São famosas as imagens do catálogo de visitas dos irmãos Lumière entre 1896 e 1897, que “possuía cerca de sessenta filmes de viagens realizadas na região do Magreb: Argélia, Marrocos e Tunísia”, imagens feitas por Alexandre Promio, famoso operador de câmera dessa companhia. Segundo Joel Zito Araújo, cineasta e pesquisador brasileiro, no entanto, essas imagem contribuíam para um imaginário pejorativo sobre o que era a África e o africano e africana, apresentando uma ideia eurocêntrica e de representação questionável, “colocando-os como exóticos, animalescos, primitivos e apagando a pluralidade étnica e geográfica do continente”. Isso obviamente contribui para uma formação social e política europeia que se modelava, à época, por sua superioridade aos africanos, justificando a colonização e a banalização do corpo e da vida em geral do povo do continente africano.

Houve diferenças nesse tipo de colonização por imagens, cita Zito Araújo (2015), que “enquanto os britânicos e belgas instalaram unidades de produção na África para produzir filmes coloniais específicos ao público nativo, inclusive incorporando-os ao trabalho como parte do elenco ou da equipe técnica, ‘os franceses não possuíam nenhuma política para produção cinematográfica que fosse especialmente planejada para seus subordinados na África’ (Manthia DIAWARA)”. Os métodos eram diversos, mas todos exploratórios e pejotarivos. No início do século XX surge então a primeira escola de cinema africana, a egípcia, “seu primeiro filme foi projetado e realizado em 1907” e hoje o Egito é o terceiro país no mundo onde o cinema nacional é preferido, ainda segundo Zito Araújo (2015). Sobre o que seria o cinema africano Manthia Diawara, professor da Universidade e Nova York, cineasta e escritor, diz em uma entrevista a Leonardo Luiz Ferreira que “o cinema africano nasceu com a independência dos países africanos, como uma missão de autorrepresentação, definir de si próprio, e como um meio artístico e espaço para a produção de culturas africanas autênticas”. É importante frisar que qualquer definição de cinema africano inclui os filmes feitos por diretores da África e da Diáspora africana; o uso de línguas africanas nos filmes; e o comprometimento – particularmente na fase inicial (anos 1960) – para descoloniza e criar imagens revolucionárias (…). Muitos historiadores conectam o nascimento do cinema africano ao filme Barom Saret (1963), de Ousmane Sembène, que você pode assistir abaixo:https://www.youtube.com/embed/VdaC4Oa_z80?wmode=transparent&autoplay=0&theme=dark&controls=1&autohide=1&loop=0&showinfo=0&rel=0&playlist=false&enablejsapi=1

Não porque é o primeiro filme africano já feito, existiram filmes anteriores feitos por diretores no Egito, Sudão e África do Sul, etc. Mas Barom Saret foi considerado como o primeiro reflexo narrativo a pegar a identidade africana moderna como um objeto de estudo; ainda que ele empregue o discurso do “novo homem/mulher” como postulado por Frantz Fanon, Kwameh Nkurumah, Leopold S. Senghor e Amilcar Cabral. Fanon costumava dizer que ‘não existe cultura, apenas a cultura nacional’. A historicidade de Barom Saret vem da decisão de Sembène em colocar o contexto de definição de uma nação africana em busca de uma linguagem de autodeterminação e soberania. Sem esquecer que assim como o continente africano o cinema africano é bastante diverso. E é a partir dessas perspectivas colocadas por Joel Zito Araújo e Manthia Diawara, que encontro no cinema de Andrew Dosunmo uma luz própria na Diáspora africana. Andrew nos leva de Nova York direto para a Nigéria através das cores empregada em seu filme Mother of George de 2013.

O filme teve envolvidos nas seguintes premiações: Associação de Críticos de Cinema Afro-Americanos (AAFCA), 2013, Prêmio de Melhor Filme Mundial;

Premiação Black Reel, 2014, Melhor Atriz em Filme Danai Gurira; Premiação Chlotrudis, 2014, Melhor Fotografia; Festival de Cinema FEST de Novos Diretores e Novos Filmes, 2014, Melhor Filme de Ficção; Conselho de Revisão Nacional, EUA, 2013, Dez Melhores Filmes Independentes; Festival de Cinema de Sundance, 2013, Prêmio de Melhor Fotografia Dramática; Premiação do Círculo de Críticas de Cinema Feminino, 2013, segundo Lugar – Melhor Filme Sobre uma Mulher. E conta com o elenco formado por : Danai Guria, Isaach de Bankolé, Anthony Okungbowa, ukky Ajayi, Yaya DaCosta e outros. E é uma co produção entre Nigéria e EUA.

O trabalho seguirá tentando compreender como o diretor Andrew Dosunmu atravessa o caos, mas não o esgotar e trabalhar na sua intensidade com o uso das cores e da luz, esse caminho se fará também com apresentação de imagens do filme.

NO CAMINHO DAS CORES

O filme começa com um homem caminhando em meio a multidão de uma cidade movimentada fora de foco, um homem negro com uma camisa de um azul bem forte, ele se aproxima cada vez mais até invadir a tela, na cena seguinte este mesmo homem aparece centralizado entre outros homens e entendemos então que existe um drama e que ele é o centro desse drama. Ou seja, seus passos naquela rua nos levou diretamente para onde o diretor pretende desenrolar o drama: uma Nigéria familiar, de onde dificilmente somos tirados, senão pelos atravessamentos que fazem nossas percepções tremerem todo o tempo.

Nessa cena, diferenciamos o ator principal dos outros homens, mas também o tiramos do ambiente de uma cidade grande, barulho, e intensa movimentação de cidade, para jogá-lo e só então entendê-lo nesse outro lugar, algo de muito importante está sendo dito. Para frente entendemos que não é apenas isso, mas as duas primeiras cenas nos dá uma espécie de dimensão do caos às cores, como se o diretor nos tirasse do caos da grande cidade ocidental e nos repousasse nas cores daquela família que se apresenta, ele nos fez atravessar a rua junto daquele homem, explorar a sensação de vê-lo explorar a tela e nos trazer de volta a compreensão reunindo-o aos seus que identificamos com as cores vibrantes da cena. É como se ele nos dissesse: atravessamos o vasto mundo do plural, do irreconhecível, o lugar onde tudo está acontecendo com pressa e paramos aqui nas cores que vão nos oferecer algo sobre isso tudo. E dito isso, então pode se começar a trabalhar a obra de arte que é esse filme, ele atravessa o caos e nos dá o resultado em cores. É importante dizer que em nenhum momento a cidade aparece de fato, nós apenas a percebemos, de maneira bem clara, inclusive, nós podemos saber da cidade vibrantemente violenta ao fundo, mas ela está sempre desfocada, talvez para nos lembrar que o mais importante se passa no seu atravessamento, ou seja, nesse caso, naquilo que se diferencia dela mesmo estando ela ali como recipiente. Todo o mundo é então uma pequena Nigéria dentro da Cidade de Nova York, uma Nova Yorke que a gente só conhece através de Sade Bakare, amiga de Adenike, a atriz principal, que usa roupas ocidentais e fala de sua vida na cidade.

O diretor consegue então trabalhar dentro de um condensado caos, a grande cidade que está o tempo todo ali nos manda informações que chegam distorcidas, não muito completas, talvez complexas e indecifráveis, mas sempre presente, e como num organizador de mundos o mais potente que nos chega é a pequena Nigéria familiar. É claro que esse espaço é transformado pelo que vem de fora, Sade, a amiga, é prova viva disso. No entanto, está tudo ali, é esta maestria em lidar com espaços no filme que eu chamo de caminho do caos às cores. O filme não atravessa completamente o caos, ele chega num ponto preciso para fazer sua arte acontecer, e isso, para mim, explode e se comunica nas cores. Porque se enganaria quem pensasse que as cores são aleatórias, as vejo inseridas num contexto religioso yorubá, uma áurea azul que envolve toda a iluminação do filme é praticamente a história daquela família sendo contada em paralelo, esse azul é predominante e persistente. Essas cores significam energias distintas, como de fertilidade, de cuidado e educação, cada cena pode nos dizer muito sobre o que pensar ou sobre referências já existentes no mundo yorubá, o diretor foi bastante assertivo e minucioso ao nos deixar sempre dentro da cena e nos dando, a medida de cada emoção vivida pelos personagens, informações para além das imagens com as cores empregadas em cena, guiando-nos através dessas cores, que tem significados precisos nessa cultura.

E então temos uma cena onde aparece somente o rosto de Adenike, a esposa, e entendemos que o caos não poderia ter sido de fato completamente atravessado, nessa hora apenas entendemos que o diretor segurou ali, no meio de tudo, algo disso nas mãos para trabalhar com ele. O que aquele rosto em close poderia nos trazer ficamos esperando ansiosos durante aqueles segundos.

Então na cena seguinte a gente já consegue ver que é nessa mulher que os atravessamentos da trama serão trabalhados, acompanharemos através dela as oscilações do drama, os atravessamentos no caos, uma linha trêmula, mas cheia de indicativos. Ela recebe uma missão das mais velhas e a partir disso a gente pode acompanhar o que o diretor consegue apanhar do caos para  trabalhar.

TRABALHANDO NO CAOS

Os atravessamentos são colocados na tela com Adenike caminhando pela cidade, isso faz com que ele, o diretor, simplesmente sintetize o caos estando ela mesma nele, suas cores vibrantes a diferencia do resto da cidade, e o recurso de câmera lenta, algumas vezes aplicado por ele, faz com que imaginemos que aquele é um momento de síntese ou de apreensão do todo para aquela cena. Adenike está levando e trazendo informação e ao mesmo tempo trabalhando com ela, é o sensório motor posto em prática, ao jeito nigeriano de fazer, funcionando e liberando através das cores em movimento. Nesse movimento, o diretor faz com que todos passem pela cor, apesar de conseguirmos encontrar em Adenike o principal personagem dessa ação, como num teste de resistência ao caos, como se fosse isso uma prova da força de se conseguir trabalhar nesse lugar onde tudo é perigoso e pode escorregar a qualquer momento.

Faz isso em cenas que são verdadeiras obras de arte visuais, pinturas onde as cores se mesclam e se combinam, outra prova de resistência muito bem sucedida, que faz nossos sentidos trabalharem sempre no intuito de apreender alguma coisa, daí conseguir alguma condensação, mas trabalhando aí mesmo, onde tudo é cor e caos em movimento ao mesmo tempo que irrompe percepção de uma cena inteira, de um sentido inteiro ou de um conceito. Não é espantoso que todas as cores mais amplas são fortes, o diretor consegue fazer com maestria aquilo que a grande maioria dos artistas visuais dizem ser difícil, iluminar e colorir o corpo de uma pessoa negra, aí Andrew dá uma aula, não somente em cinematografia e iluminação e fotografia, mas contribui eficazmente para o desmonte de um preconceito instaurado há séculos, qualquer cena do filme poderia emoldurar qualquer galeria de arte. O caos onde Andrew trabalha não é somente o caos filosófico muito bem elaborado no filme, mas o caos do racismo, e como poucos, acerta no alvo. Entre tudo o que ele diz, algumas coisas são: um africano falando sobre africanos, ainda que seja na diáspora, tem maior probabilidade de tratar isso de modo peculiar, isso além de arte é um engajamento político e se o diretor estiver imbuído disso, o fará bem. Outra coisa é que poderia se afirma que é tudo uma questão de boa iluminação, então o filme o tempo todo nos agride com nossa própria ignorância colocando em vários pontos das fotografias luzes de verdade, como as vinda da janela ou lâmpadas, o que nos surpreende é que sua destreza vai além, a grande maioria das cenas são pouquíssima iluminadas, as luzes são figurativas, as cenas continuam escuras.

Andrew então nos dá outro tapa, a questão está para além dos recursos cinematográficos, filmar pessoas negras é mais fácil do que se imagina. A pergunta é: o que quer se ver na tela? De que forma esse cinema precisa se apresentar para o público? Andrew mostra que não há nenhum problema em quebrar paradigmas, ou mostrar os nossos.

IMAGENS RELEVANTES DE PONTOS DE LUZ

Gosto de lembrar que em cada cômodo os pontos de luz, figurativos que sejam, que iluminam a cena são perfeitamente visíveis, embora a grande maioria das cenas tenha uma obscuridade que faz um lindo contraste sob uma aura azul. Na segunda cena, por exemplo, estão às vistas vários cristais de luz acima das cabeças dos homens que reluz no laranja de suas roupas. Abaixo separei algumas que achei relevante, podemos ver o abajur, a luminária da mesa, na parede, a luz chegando da janela, todas sempre bastante visíveis:

CONCLUSÃO

Esse resumo-análise buscou analisar o filme Mather of George do nigeriano Andrew Dosunmu buscando compreender a narrativa filosófica da obra e também a organização teórica e cultural apresentada no filme, isso apoiada as pesquisas do cineasta Joel Zito Araújo e sutilmente tomando emprestado as ideias de Deleuze sobre trabalhar no caos. Procurou também mostrar em que ponto o nigeriano captura do caos a formula para seu filme e trabalha com ela explorando as cores e a luz que irrompem em belas fotografias.

E aqui abaixo, você pode assistir o filme completo já liberado para as redes. Aposto que você vai se apaixonar

REFERÊNCIAS

África Cinema Um olhar Contemporâneo

Leonardo Luiz Ferreira (org.).- Rio de Janeiro: Caixa Cultural, RJ, Junho de 2015.

Campelo, Thiago

Não São As Imagens /Thiago Campelo http://naosaoasimagens.com/2014/11/02/mother-of-george-2013/ Em 30 de Agosto de 2015.

Deleuze, Gilles

La Peinture et la Question des Concepts – Peiture Cours (fragmentos)/ Gilles Deleuze; transcription Damien Houssier. – Cours 15 e 16 de 1981.

Mother of Georgehttp://www.adorocinema.com/filmes/filme-204829/creditos/ Em 30 de Agosto de 2015.

* Agradeço a generosidade do grande cineasta Joel Zito Araújo por liberar seus estudos particulares a estudantes da oficina de cinema ministrada no ano de 2015.

Fonte: https://www.pequenaeleko.com/single-post/2016/06/17/DO-CAOS-%C3%80S-CORES-O-CINEMA-AFRICANO-DE-ANDREW-DESUNMU

http://www.naiarapaula.com/

Meet a traveller: Lola Akinmade Åkerström, travel writer and ...

Lola Akinmade Åkerström é uma fotógrafa e escritora de viagens nigeriana premiada, residente em Estocolmo, Suécia. Ela é a editora-chefe da Slow Travel Stockholm. 

Life is a Journey: Lola Akinmade Discusses Travel, Photography and ...

Site: https://www.lolaakinmade.com/about/

Andrews em 1982. Foto de Kathy morris

Benny Andrews foi um pintor, gravurista e colagista norte-americano

Benny Andrews nasceu na zona rural da Geórgia em 1930. Ele começou sua prática de pintura enquanto estudava na Escola do Instituto de Arte de Chicago. Depois de se formar em 1958, mudou-se para a cidade de Nova York, onde continuou seu trabalho, desenvolvendo uma técnica de colagem grosseira e expressiva que incorporava tecido e papel cortado em suas pinturas a óleo. Em 1962, a Forum Gallery montou sua primeira exposição individual em Nova York. Ele passou a desenvolver uma reputação de artista social e defensor de uma maior visibilidade dos afro-americanos no mundo da arte. Nas quatro décadas seguintes, fez e exibiu trabalhos em Nova York, dedicando-se ao ativismo e à educação comunitária.

Esta imagem tem um texto alternativo em branco, o nome da imagem é image-9.png

Andrews continuou sua produção prolífica de obras de arte, que variaram de explorações da história e justiça social a representações íntimas de amigos e familiares, até sua morte em 2006. Ao longo de sua vida, ele foi inflexível ao afirmar que, para efetivamente mudar as mudanças sociais, fazer arte não bastava. . Ele liderou programas de educação artística para alunos carentes por meio do Queens College e de programas da comunidade local, e implementou um modelo inovador para o ensino de arte nas prisões. Em 1969, ele co-fundou a Coalizão Cultural de Emergência Negra, que exigia maior visibilidade para pessoas de cor nos museus de arte e no cânone histórico.

Sweet Black Man, 1996, Benny Andrews Medium: óleo, colagem https://www.wikiart.org/en/benny-andrews/sweet-black-man-1996

Andrews ensinou no Queens College nos anos 90, parando brevemente, de 1982 a 1984, para atuar como diretor do programa de Artes Visuais da National Endowment for the Arts.

Benny Andrews faleceu em 10 de novembro de 2006, no Brooklyn, Nova Iorque.

Thresh Hold, 1992,

Fonte: https://www.bennyandrews.com/


Quando eu morder
a palavra,
por favor,
não me apressem,
quero mascar,
rasgar entre os dentes,
a pele, os ossos, o tutano
do verbo,
para assim versejar
o âmago das coisas.

Quando meu olhar
se perder no nada,
por favor,
não me despertem,
quero reter,
no adentro da íris,
a menor sombra,
do ínfimo movimento.

Quando meus pés
abrandarem na marcha,
por favor,
não me forcem.
Caminhar para quê?
Deixem-me quedar,
deixem-me quieta,
na aparente inércia.
Nem todo viandante
anda estradas,
há mundos submersos,
que só o silêncio
da poesia penetra.

Conceição Evaristo

A pintura que ilustra o poema é de Frank Bowling